domingo, novembro 30, 2003

Desvios

Descalcei uma senhora à saída do metro. Pisei-lhe o sapato e ela não se importou. Por causa disso perdeu a ligação. Que alterações terá aquele atraso provocado na sua vida?
Derivações de um barco ébrio

Este blog embebedou-se, perdeu as chaves de casa, encontrou-a vazia. A reestruturação seguirá nos próximos dias, ainda trôpega.

sábado, novembro 29, 2003

Self made show

Marcel Duchamp, afinal, contribui em quê para a arte?
A pergunta/afirmação provocatória foi, ontem, lançada em off (portanto protegida dos olhares espantados do público) por Rogério Nuno Costa, na estreia do seu novo espectáculo Saudades Do Tempo Em Que Se Dizia Texto (Teatro Taborda, 21h30; reposição, em Lisboa, no Hospital Miguel Bombarda, em Janeiro).
A exposição da sua persona é feita a partir de uma imagem por ele projectada/conduzida. Ou seja, "o" Rogério Nuno Costa que "o" Rogério Nuno Costa nos apresenta é uma personagem a fazer as vezes da verdade que faz as vezes de personagem. O melhor de si. O "exposto" parte do negro, o seco, o amargurado, o triste, o preocupado, o desencontrado, o confuso... para, mais ou menos a meio, se apresentar como sendo "um príncipe que vive alegre na sua liberdade". Mas qual Rogério?

"Eu" nu. "Eu" vestido. "Eu" a rir. "Eu" a chorar. "Eu" parado. "Eu" a andar. "Eu" a responder. "Eu" a perguntar. "Eu". "Eu". "Eu"... E, no entanto, não é um espectáculo feito do "eu", mas antes de se ser "eu". De se ser o Rogério Nuno Costa. O que sou eu, pergunta (-nos) ele? "Tenho cara de relógio?", "de quem amua?". Sou mais eu se for visto por ti ou existo porque tu estás em mim? Convoca Sartre e Descartes mas não ousa a alteridade. Porque o Rogério Nuno Costa não está à procura de um outro em si. Está à procura de si. De si em si. É sobre o vocês em mim, sobre o que deixamos nos outros e eles em nós. E é, também, sobre a forma como crescemos ao conhecer outras pessoas, em forma de agradecimento. Em jeito de pergunta: e depois de vocês, depois de tudo, que eu é que existe?

Disse-lho já. No seu processo o Rogério é tanto mais honesto quanto maior for a "dor" de chegar ao produto final. Porque na fragilidade desse resultado - dependente da reacção do público - se encontram todas as razões de se ter iniciado o processo. O que ele pretendia era voltar a 1978, ao ano sem memória. E quando não há memória o caminho que se faz é o coleccionar "memorabilia" e perceber de que forma nos relacionamos com ela. Que laços se estabelecem entre o que existia antes de nós e a apropriação que dessas coisas fazemos? Que espécie de relação/importância têm, para nós, as circunstâncias - no seu sentido mais lato - que rodearam o nosso nascimento?

"Eu" tenho 3 anos. "Eu" tenho 5 anos. "Eu" tenho 10 anos. "Eu" tenho 25 anos. E agora? É um balanço? Não. Um ponto de chegada? Talvez. Um reinicio? Só se tiver acontecido uma total apreensão do que se passou anteriormente. O "Rogério" não cansa, mas tal acontece porque quem o viu estava ganho à partida. Sabia de uma ou outra coisa, partilhava com ele momentos anteriores e, sobretudo, porque também faz parte da vida dele. Pode, por isso, rir-se de si, porque o "Rogério" começou primeiro. E se quem provoca é o primeiro a rir, permite que se deixem iludir os outros pois permitem recuperar - ao "exposto" - o último lugar. O que é daqueles que riem melhor. Por isso, não se pode achar que o "Rogério" não ri. Ainda que atrás desse riso possa estar uma profunda tristeza; uma imensa pergunta: riem de quê se riem de mim? E eu?

A prova de fogo será quando "ele" falar para a massa anónima. E aí, atrás do riso estará o receio que esconde o riso, que esconde... Camada após camada, descascando-o/se como a uma cebola, ao encontro do rogério (assim mesmo, em letra pequena) que se apresenta como um miúdo na festa de natal à família, que a convida a participar, que a desafia a despir-se das poses, das personagens, dos preconceitos... para reencontrar a criança. Ou melhor, para encontrar o "grau zero de mim". Por isso, se torna mais difícil a aposta, agora que os amigos e conhecidos se divertiram tanto. E quando for a vez dos outros?

Podemos invocar uma tradição de stand-up comedy (termo tão em voga que qualquer dia será necessária de uma definição melhor), mas julgo antes tratar-se de um discurso na primeira pessoa que só encanta e diverte porque através da desconstrução de uma seriedade - essa que carregamos todos os dias - é que se encontra o genuíno prazer. O segredo deste álbum - deste "catálogo" desejado na voz-off inicial - é o segredo que já existe no subconsciente do autor. Ser-se é mais fácil quando não se pensa nisso. Mas não há quem não queira saber quem é. Poucos são os que se atrevem a fazê-lo. Menos aqueles que o fazem como o Rogério.

Talvez Rogério Nuno Costa não fale de um "ajuste de contas" com o passado, mas a primeira ideia que surge é um "baralhar e voltar a dar" para obter a palavra final. Mas, nem isso é constante, porque a nudez com que se apresenta e a honestidade e franqueza com que se expõe desarma-nos. Não porque não nos sintamos impelidos a viajar na nossa própria história, mas principalmente porque sabemos que ao iniciarmos a viagem, no regresso teremos que encontrar-nos melhor.

Vi-o depois, ao Rogério, cansado e com dúvidas. Mergulhei na sua generosidade e agradeci-lhe por tudo. Talvez, também, por se Ter mostrado. Mas, e principalmente, por nos fazer acreditar que é impossível definirmo-nos. Ainda mais se formos procurar razões ao nebuloso momento da criação.

sexta-feira, novembro 28, 2003

Casamento

Nos últimos 4 dias fui surpreendido com a notícia de duas queridas amigas se casaram. Assim, ainda o ano ia a meio. Como não fui convidado para o casamento, depressa me apressei a felicitá-las, desejando-lhes muitas e longas felicidades. Uma olhou-me desconfiada, preparada que estava para o bombardeio de questões, dúvidas e ironias que em mim são nota corrente. A outra desculpou-se pela gaffe e convidou-me para jantar em sua casa para mostrar fotografias e prendas.

Entre um discurso e outro, fico sem saber se a felicidade vem mais depressa com o casamento ou se o Woody Allen tem razão: as pessoas casam-se quando não tem mais nada a dizer uma à outra. Uma amiga respondeu-me que depois do casamento ela era a mesma mas com uma anilha no dedo. Arrepiei-me profundamente. A outra disse-me que, de facto, não tinha nada para fazer naqueles dias antes do casamento e por isso aceitou o ambíguo pedido do então namorado.

Acreditei mais nesta história que na outra. Talvez porque esta viva das descreças comuns e considere o casamento como algo mais natural numa relação. A outra enfrenta-o como o passo seguinte. Entre uma e outra opinião vão anos de distância de relacionamentos, sejam eles platónicos, amorais ou ambíguos.

É claro que fui para casa de alma seca e coração descoroçado. Não ter ido ao casamento não me incomoda, sou um tanto descrente e conheço-me o suficiente para saber que todos reconhecem a fita cola a segurar os cantos do lábio que monta um sorriso. Mas não deixo de achar que me tornei cinzento demasiado depressa.

Em breve, a definição de bobo
Recomendações

O livro da Ana Vicente, que ontem me surpreendeu na sua serenidade e confiança. EUbarraTubarraMIM, como nunca é de mais repetir está à venda na Fnac do Chiado, na Eterno Retorno, Ler Devagar, Almedina do Saldanha, e em Viseu, Coimbra (Almedina também) e Porto. Bela edição, magnífico texto. A Ana está, para mim, como o mais perto de encontrar uma definição da 4ª pessoa do singular, essa entidade que procuramos nas vezes do amor.

O filme Nós, de Cláudia Tomaz, para apreciar o belíssimo trabalho da Susana Vidal, constante actriz e emprenhada performer, que chegou a Portugal por via da EXPo'98 e por cá ficou, fazendo um trabalho exemplar de criação teatral. Num meio quase secreto, como é o do teatro alternativo, a Susana tem criado um clube de fãs, seja no brilhante trabalho que faz no Grupo de Teatro do Técnico, seja como criadora individual. Descubram-na.

A peça Saudades do tempo em que se dizia texto, hoje em apresentação única no Teatro Taborda. Estreará, depois, em Lisboa em Janeiro, no Hospital Miguel Bombarda. O trabalho de Rogério Nuno Costa é uma viagem ao interior das questões de ser actor, criador e teórico quando confrontado com um público. Um discurso articulado, coeso, límpido e honesto. as melhores descobertas, para mim, nos últimos anos.

quinta-feira, novembro 27, 2003

Do avesso

As primeiras impressões que tive dos blogs foram lidas no do Pedro Mexia. De facto, pouco mais pareciam que relatos de opiniões sobre filmes, músicas, livros... (o que tem um aspecto positivo: há um público. Resta saber onde se encaixa.) Mas, de repente, ao se lerem opiniões diversas, encontram-se surpresas. Não fosse o medo de estragar a pintura toda e adicionava-o à lista do lado.
Falar de amor, quando não há mais nada

Sobram poucas coisas nesta vida pelas quais valha a pena bater-se. O maior é, sem dúvida, o último reduto do prazer. O Bruno, questiona-se, sabiamente: o fazer amor é já uma contradição nos termos.

Parece-me a mim que ao invés de se "fazer amor", antes "cria-se amor". O amor, entidade abstracta e hormonal, está assim sempre pronto a ser preparado, desde que essa seja a intenção dos que o praticam. Não se "cria amor" de cada vez que se "faz amor". Por vezes faz-se amor sozinho. Os dois corpos podem até estar a fazer as vezes de um só, e os olhares podem ficar eternamente fixados no objecto amado, mas o que acontece é antes uma libertação da mente e o regresso a um estado sensorial primá¡rio. O culminar do orgasmo não quer, propriamente, significar que se chegou, por "culpa" da outra pessoa a esse momento zero. Antes, encontraram-se formas de se chegar lá, "utilizando" os desejos, as técnicas, os enleios de um elemento exterior.

Para quem já se sentiu deveras incomodado com esta noção de prazer, ponha a mão na consciência e pense lá quantas vezes não fingiu retardar o orgasmo para não fazer sentir mal o parceiro/a, ou, melhor ainda, não atingiu o orgasmo ao descobrir - pela libertação de tensões - a solução para determinado problema, desde o IRS ao fim do ano às botas para o inverno. Eu, culpado, me confesso. E não é por isso que posso dizer que tive menos ou mais orgasmos, ou antes que "fiz" mais ou menos amor. Afinal, pode-se mesmo dizer que se está a "fazer" amor se o que estivermos a fazer for antes uma descompressão?

Parece-me que a única altura em que se pode dizer que se está a "fazer amor" é quando estamos a dar prazer ao outro sem nos preocuparmos connosco. Aí­ sim, o amor existe.
A razão de ser do 118

Confesso que se há alguma coisa na qual sou viciado é no 118, ou na sua versão upgrade o 12118 onde somos atendidos pessoalmente e pedir o número de informações que quisermos. Pedir podemos pedir, normalmente nunca encontram.

Ora a razão de ser deste serviço não é descobrir o que nós não encontramos? Se as páginas amarelas não estão actualizadas, se a internet não funciona, se a agenda de contactos está perdida algures dentro de casa... não é para situações destas que se inventou este serviço?

Peço Centro Cultural dão centro de saúde, quero saber o número da Câmara de Lisboa pedem-me a localidade, desespero por não saber o nome correcto de uma instituição e acusam-me de não ter dito o "de" que fazia tanta falta. E quando encontramos por nós mesmos o número - porque os que nos dão não fazem referência se é fax, se está desactivado, se não está registado sob este ou aquele nome - não podemos voltar a falar com o funcionário que nos deu a informação, dizem que não podem receber chamadas pessoais. Mas então para que é que dizem o nome se não podem ser chamados?
Traído pelo obscuro

Ontem, ao querer dar conta do que me interessava partilhar neste blog, perdi mais de dois terços dos links, os arquivos, as referências noutros blogs e demais coisas que se estendiam coluna à direita abaixo. Não sei justificar o texto central, alterar cores ou perceber o Blogger. Se assumir que andei o resto do dia preocupado, estarei a tornar-me blogodependente?

quarta-feira, novembro 26, 2003

La nave va...

A Zero em Comportamento vai acabar. Recebo um e-mail de desabafo. Envergonhem-se, pois, os que nada fizeram para que tal não sucedesse.

"A Zero em Comportamento tem passado anos de
sacrifício, a viver com o credo na boca, sempre na eminência do dinheiro da bilheteira não chegar para pagar as contas. Estivemos dependentes das
flutuações dos humores do público, da chuva, do frio, do calor, dos jogos de futebol na televisão, das estreias do cinema comercial ou dos ciclos de outros cinemas; dependentes dos humores da crítica e do espaço disponível nos jornais, nas rádios ou nas televisões; dependentes ainda da nossa capacidade de distribuir pela cidade os folhetos e os cartazes com a programação, de os enviar a tempo pelo correio ou email. Estamos cansados porque os donos do Cine-Estúdio 222 não resolvem os imensos problemas que aquela sala, de imenso potencial, tem. Sabemos bem
que, por causa das condições da sala, este projecto que tanto trabalho e gozo dá, estava, desde o ínicio, sujeito ao insucesso. E estamos fartos de, sistematicamente, recebermos reclamações de pessoas a dizer que a sala cheira mal, que as cadeiras são desconfortáveis, que chove lá dentro, que a projecção é má, etc etc etc... e de sabermos que é verdade!!!
Estamos cansados de nos dizerem que o nosso projecto é fantástico, maravilhoso, único, etc, etc, etc, mas que é uma pena ser feito naquela sala e de, por isso, nos pedirem, suplicarem, ordenarem, que mudemos de sala e perante a pergunta: “Mas para que sala?”, só ficar o silêncio, por falta de alternativas ou de ideias... E por isso termos de responder: “pois é, a sala é má, mas é a única....”.

Finalmente, estamos cansados e desmotivados por, há que tempos, ouvirmos a Câmara Municipal de Lisboa ou o ICAM dizerem que, de facto, o nosso projecto é fantástico, maravilhoso, único, que merece de ser apoiado, mas até hoje não terem contribuido com nada de concreto! Por isto tudo e por muito mais que fica por dizer, decidimos parar. Vamos deixar de programar o Cine-Estúdio 222. O projecto “Zero em Comportamento” vai ficar congelado até melhores dias.

Até haver outras condições para se trabalhar. Até alguém finalmente tomar decisões a sério, e não apenas de fachada, e nos alugar, disponibilizar ou oferecer, em condições aceitáveis, uma sala de cinema condigna para fazermos um programa por ano, por cada seis meses, por mês, semana ou dia. Ou então, até alguém perceber que é mais importante haver projectos culturais que se afirmam no dia-a-dia, durante o ano inteiro, do que eventos fugazes, esporádicos, que levantam imensa poeira mas que não deixam ficar nada depois de acontecer. Mas, enfim, há quem prefira ouvir as cigarras do que reparar no trabalho da formiga...

Paramos, mas fazêmo-lo de consciência tranquila porque, ao longo destes anos (e já passaram seis desde o primeiro filme que exibimos no 222), provámos que há públicos para as mais diversas ofertas de cinema (sejam curtas, documentários ou longas dos países mais improváveis). Basta ter vontade e saber chegar a eles (aos públicos e aos filmes). E quem tiver memória lembrar-se-á, por certo, da oferta de cinema que havia nesta cidade e poderá comparar com o que há hoje... Mas sabemos também que quem tem a iniciativa, desbrava o terreno e lança as sementes, não é necessariamente quem colhe os frutos...

Um grande obrigado a cada um(a) e a todos os que nos foram impulsionando, encorajando e criticando ao longo destes tempos. Isso significa que fizemos a diferença e no fundo isso é mesmo a única coisa que interessa...
Encontramo-nos por aí!

Rui Pereira
(Zero em Comportamento)"
O complexo de Santana

Ao invés de um tabu, Santana Lopes insiste numa versão neo-romântica do mito de Édipo. Sendo que, para o caso, a mãe é Sá Carneiro e o pai Cavaco. Compreende-se que assim seja, afinal seria uma desfeita muito grande para o primeiro e uma desconfiança para o segundo se o contrário sucedesse. Se, Santana efectivamente desistisse de se candidatar a Belém, para dar lugar a Cavaco, teria que ficar em Lisboa, cidade que alui, não atrai financiamentos, está de portas abertas ao crime, à violência, à falta de verbas, à permanência dos ministérios no Terreiro do Paço. Para dar lugar a Cavaco, Santana teria que ir mais longe e continuar subjugado a um lugar de vice-presidente do PSD, onde a palavra final cabe sempre a Durão Barroso.

Por outro lado, se Santana for para Belém teria que aprender a ser mais recatado. Uma coisa é ficarnos nostalgicamente encantados com os cachecóis amarelos de Jorge Sampaio a passear no Chiado à meia noite. Outra completamente diferente é termos a Kapital fechada porque o presidente e as santanetes querem dançar até mais tarde. Não há jovem que aceite isso.

Ser Presidente implica decoro, recato e discrição. Implica não se saber por onde se anda, o que se faz e o que diz. Ora, ainda que Santana esteja muito bem nesta última função. Santana é tudo menos discreto e seguro. Sofre da instabilidade passional de qualquer caranguejo, que se encanta com o que se segue, sem ter acabado de cumprir o que iniciara.

Mas, se a paixão de Santana por Sá Carneiro é assim tão grande, porque raio não encontrou ele ainda solução para a cabeça dependurada do ex-líder do PSD que há anos se sustenta no Areeiro?
A ver navios...

Pois, a taça América foi para Valência. Lisboa perde assim a possibilidade da sua organização. Resta agora, se querem uma dar uma chapada de luva branca, ir lá e ganhar. assim, organizam na próxima e recuperam o espaço. Que vão fazer agora se não há dinheiro para investir na reorganização da doca de Pedrouços?

E por favor, não fiquem a chorar nem ofendam Valência. Entrar em concursos é mesmo assim, só há dois resultados, como diz o outro: ou se ganha ou se perde ou se empata.

terça-feira, novembro 25, 2003

Mudanças

Aquando do encontro de blogs falou-se alguma coisa da necessidade de um arquivo para a memória futura (expressão arrepiante...) do que ia sendo escrito nos blogs. Se tal já tivesse acontecido, não teríamos perdido os belos textos do Blue Eyed Pop que se extinguiu. É certo que agora se chama Respigador e o Filipe não desistiu, conforme temia.

Esta coisa de se criar um blog, depende, obviamente, de quem o cria e está sujeito às mudanças de carácter desse mesmo criador. Mas a mim faz-me confusão ser abandonado assim de vícios antigos. Filipe, se estás a respigar por aí, faz juz ao nome e recupera os textos do defunto. A bem da nação.

segunda-feira, novembro 24, 2003

Ao telefone

Talvez seja um disparate filosofar sobre o quotidiano, mas pergunto-me porque é que reagimos ao telefone como se tivessemos a pessoa à  frente.

Eu, por exemplo, levanto-me da cadeira, afasto-me o mais estupidamente possível dos papéis em que tenho as informações precisas e nem sequer levo caneta para apontar, sei lá, na parede ou nos cortinados. Depois passeio-me pelo escritório como se estivesse a dar palestras. Se quem está do outro lado do telefone imaginasse a agitação com que falo, nunca me confiaria nada.

Mas, surpreendentemente, do outro lado, a agitação não é menor. E, no entanto, quando nos encontramos com alguém ao vivo, a tensão toma conta de nós, não sabemos onde por as mãos, o corpo não responde. Ou melhor, responde pela sua apreensão.

Estaremos nós condenados a expressar-nos melhor na escuridão?
O livro da Ana

Falhei ao lançamento do livro da Ana. Deixei-lhe uma mensagem, corado de vergonha. Redimir-me-ei dia 27. Fica o convite. Ora leiam.

O Lançamento irá decorrer na Livraria Eterno Retorno (ao bairro alto), dia 27 de Novembro pelas 22 horas e conta com a presença da autora. Antes da apresentação da obra pela cineasta Raquel Freire, haverá uma performance inspirada no livro, dirigida pela encenadora Susana Vidal e interpretada pelos actores Gustavo Vicente, Alexandre Ribeiro, Sara de Castro, Vasco Freire e também
Susana Vidal.

O livro chama-se EUBARRATUBARRAMIM e se houver justiça nest mundo dos afectos, será o desvendar dos segredos de estarmos enamorados. Ora descubram, se tiverem coragem.
Nota

Não regressei, antes vim aqui pousar umas coisas para não ficar muito carregado.
Recomendação

Para os que se perguntam porquê, para os que ainda não aderiram, para os que lutam por uma insistência, para os que se deixam tomar de amores, desamores, humores, temores, para os que não querem saber, para os outros que não vivem sem, para o bem e para o mal... o texto do Aviz é o respirar da blogosfera a caminho da libertação. Afinal os blogs nasceram com os seus autores. Criar barreiras é tão pernicioso quanto querer saber porque o fizeram. Ainda bem que o fizeram. O mundo fica mais perto assim.
Carla Bruni, je t'adore

Nestes dias cinzentos troquei o delicodoce da Sarah Vaughan pela beleza agreste e neglige da Carla Bruni. Lentamente a caminho do fim do ano, volta-se a acreditar na leveza das palavras e na força do seu sentido. Como se pode viver sem tudo menos sem amor, a Carla Bruni faz as vezes do cheiro, das marcas e dos gestos de quem se amaria, se existisse.
Depois de casa assaltada...

Augusto Santos Silva escreveu no PÙBLICO de sábado sobre as condições do Teatro Nacional. Não "o" Teatro Nacional, mas "um" teatro nacional. O que é mais impressionante é a displicência com que o faz, quase esquecendo que foi Ministro da Cultura e que nada fez. Já em 2001, e em jeito de resposta a um elucidativo artigo que Luís Miguel Cintra escrevera no Jornal de Letras, levantara uma série de questões de grande monta para a resolução de problemas do teatro nacional. Corrijo, apontava antes falhas, indicava caminhos e... era só isso. O então responsável pela cultura em nada alterou a ordem das coisas, no seu tempo de gabinete. Ora foi apanhado de surpresa... pois então, mas as coisas preparam-se se as quisermos mudar.

As empresas continuam sem saber o que é a lei do mecenato, os concursos estão cheios de dúvidas, as condições de difusão e co-produção fora de Lisboa dependem mais da boa vontade de teceiros que da força do Estado... A história da galinha que queria fazer pão aplica-se que nem uma luva, mas ao contrário, no discurso de Santos Silva.

O que é tanto mais impressionante é a leveza com que afirma querer acreditar numa resolução compatível para todos. O que parece que Santos Silva se esquece é que quando não se faz nada ao se ter o poder na mão, não se pode depois vir pedir contas aos que se seguem. Ou luta por melhorar ou ...
Um dia como os outros

Há dias assim, em que a uma nuvem se segue outra nuvem e a vida parece não ir sofrer grandes alterações. Mas assim, como se não fosse nada, alguém decide invadir uma escola - a sua escola - e disparar sobre tudo e todos. No fim, e em jeito de imolação, suicidam-se. Não restam provas, factos, razões ou pretextos. Só o curso normal da vida desviado.

O que Gus van Sant faz em Elephant - Palma de Ouro em Cannes - é criar, a partir do facto simples e do gesto inconsequente de se ser adolescente num liceu não referenciado algures na América, um mosaico de histórias vazias de conteúdo mas plenas das questões prementes de se ser jovem, americano e estudante. Como se nada fosse mais importante do que isso. E o soco no estômago que van Sant nos dá, que nos leva a curvar e ficar indisposto, é tanto mais impressionante quanto a leveza somente aparente do filme. Não há culpa, erro, falha ou medo. Há um dia que é diferente dos outros.

Na gerência das tensões que o espectador vai criando, querendo identificar os assassinos através de comportamentos inócuos, Gus van Sant ensina-nos que não vale a pena tudo saber, tudo conhecer. O perigo pode estar sentado ao nosso lado. E o próprio perigo não saber ainda disso. Artista iconoclasta, em que as liberdades artísticas são levadas ao extremo, o realizador permite-se metaforizar acerca do masacre de Columbine, atribuindo-lhe contornos pouco definidos e que deixam o espectador desprotegido.

Um filme obrigatório, sobretudo para quem não consegue viver sem esconder que sabe o que se seguirá. Em Elephant a surpresa, o espanto, o horror e o choque está mais no espectador e na sua ingenuidade que nos dois rapazes que mataram os colegas em Columbine.

sexta-feira, novembro 21, 2003

Silêncio

Algum dia tinha que ser. Este blog espera melhores dias dos seus alimentadores. Por mais que o tenha aberto e por mais coisas que queira por aqui, falta-me o engenho e a arte, para além do tempo, da cabeça e do resto para o alimentar. A ver vamos o que se segue.
Early morning post

Acho que nunca pus um post tão cedo. A verdade é que ainda não abri os olhos completamente e o café é uma miragem. Ainda não sei se choveu, mas já percorri os habituais blogs. Também não sei o que fiz durante o sono para ter acordado tão cansado. O dia vai ser longo e pensativo. Tenho que melhorar algumas partes do discurso. Logo à noite apresentação do livro da Ana. Que lhe hei-de dizer? A impressora começou a trabalhar. Já vai na segunda volta de texto. Estou disruptivo. Bati um record.

quinta-feira, novembro 20, 2003

Portugal - Koweit

Então eles recebem-nos de braços abertos, ajudam ao transporte de jornalistas feridos, são alvo de atentados e nós vamos derrotá-los com 8 golos?

Haja decoro, senhores.

quarta-feira, novembro 19, 2003

Santa Ignorância

Aqui ao lado, abrem-se as portas do mosteiro para mais um observador. Em jeito de carta de princípios, o Sérgio diz melhor o que já nos esquecemos: essas, as razões que nos levaram a abrir o mundo às nossas mentes. Quais os votos a que teve que se sujeitar não se sabe. Mas valerá com toda a certeza a pena.
In the mood for love

Aquilo não acontece e nem mesmo nos filmes. Nada, em lugar nenhum é tão inverosímil quanto o que nos é apresentado no filme Love Actually. E, no entanto, nunca foi tão bom acreditar que seria tão bom se fosse verdade.

Ontem, fim de tarde, cinema londres renovado, o frio a passar as camadas de roupa... e até ao fim um sorriso estampado na cara, crentes de que se há situação em que tudo pode (e deve) acontecer é no amor. E só o cinema para nos dizer isso

Não se apanham aviões à última hora e de rompante (pelo menos em lisboa); o primeiro ministro não é solteiro, embeiçado por uma empregada e iniciador de uma crise institucional com a américa (veja-se a chegada de Bush a Londres); o amor não termina quando dizemos basta... tantas e tantas outras situações.

Corações empedernidos ou não, romanticos incuráveis ou descrentes, melancólicos racionais e chocolato-dependentes... o filme é para nos fazer fingir que, por momentos, a vida pode ser uma coisa, sem outros problemas e que o amor é, de facto, a única coisa que vale a pena.

Na senda de outros comentários sobre que filmes levar num 1º encontro, eis um ideal. E para reconciliações, até rompimentos, se daí resultar outro amor. Ou um filme para se ver com amigos. Aqueles que se amam.

terça-feira, novembro 18, 2003

Vacas Loucas

A notícia é tanto mais inusitada quanto surpreendente. Veio no Local do PÚBLICO de 12 de Novembro e dizia assim: "Vacas selvagens preocupam populações rurais e automobilistas da Chamusca" Pois então acontece que uma manada de vacas selvagens que há cerca de quatro anos percorre sem qualquer controlo a zona da charneca da Chamusca estão a começar a preocupar as populações da região, depois do ataque de uma das vacas à  carrinha de um empresário da Golegã, no fim de Outubro.

As ditas vacas, ao que constam, fugiram de uma manada maior que havia sido vendida a um comprador de Benavente e desde então têm vivido como selvagens na região. Houve já acidentes com motorizadas e automóveis pois as ditas atravessavam-se na estrada.

Mas nunca haviam atacado pessoas. E aqui o caso é mais grave, disse o presidente da junta. Ora tendo a autarquia uma acção limitada e estando as vacas, muitas das vezes, em terrenos privados, as populações estão assustadas.

Estarão as vacas possuí­das? É o princípio do fim do mundo como o conhecemos? Todos nós temos a imagem das mulas sem cabeça, das vacas que correm em fogo, mas e agora? Estarão as vacas a lutar pelas quotas de leite? Será que têm como hino a canção da Gal Costa: vaca profana põe teus cornos/ (...) / eh eh eh eh / dona das divinas tetas...

Vazio

Não fosse Lisboa a capital do reino e eu não acharia importante a questão. Saí mais cedo de casa que o habitual e não vejo ninguém na rua. A populosa Graça está vazia, no metro anda-se sentado, nas ruas os carros são poucos, não se fica à espera nas repartições...

Para onde foste Portugal?

segunda-feira, novembro 17, 2003

A lei dos amantes (11)

«recuso os sonhos que te ignoram e os desejos que não possas despertar. Não quero fazer um gesto que não te louve, nem cuidar uma flor que não te enfeite; não quero saudar as aves que ignorem o caminho da tua janela, nem beber em ribeiros que não tenham acolhido o teu reflexo. Não quero visitar países que os teus sonhos não tenham percorrido como taumaturgos vindos de fora, nem habitar cabanas que não tenham abrigado o teu repouso. Nada quero saber de quem te precedeu em meus dias, nem seres que aí permanecem»

Rainer Marie Rilke em carta a Lou Andreas-Salomé
Aperitivo

Falando em amor e no resto, ontem, enquanto esperava que o arroz de pato assasse passava um documentário animal na SIC. E falava da cópula das baleias. Dizia então que os testículos da baleia macho pesavam uma tonelada, que a força do esperma a ser ejaculado era de cerca de 30 kms/hora e que podia expelir o anterior esperma lá colocado, caso a baleia fêmea não tivesse sido fiel. Dizia mais. Dizia que a vagina da baleia tinha um comprimento de 1 metro.

Fui almoçar fora.
Kundera, depois do fim

Em post anterior falava que me custava atravessar o Kundera e a sua Intimidade. Terminei-o ontem, a duras penas, quando o vento soava muito mais forte que as palavras dele.

Ficam-me duas ou três imagens: a ideia de que os sonhos são confusões da realidade por misturarem passado com presente e futuro; que a Marguerite Duras escreve muito melhor sobre o silêncio nas relações; que o nouvel roman francês faz do sexo uma fronteira freudianamente intransponível; que o Kundera não soube fazer um final.

Preciso de uma leitura partilhada.
A marca

O Bruno volta à carga, naquilo que ameaça tornar-se num belo levantamento de questões amorosas neste século que ainda não deu por findo o anterior. Desta feita trata das marcas de amor, ou antes, da força dessa necessidade.

Há um poema do João de Deus, se não estou em erro, que diz qualquer coisa como, "beijo na face, pede-se e dá-se", diz o rapaz atrevido que leva como resposta da sonsa menina: "dá-se?", e ele volta à  carga: "dà". Eu já não me lembro que voltas dá o rapaz mas acho q acaba por roubar o beijo à  rapariga. Aquilo que o Bruno fala é antes de um làbio entre o beijo... da vontade de se ser da outra pessoa. E não fosse isso quase louva-deusiano e poder-se-ia dizer q é assim que nos sentimos nos primeiros momentos da paixão, ou em noites em que o assomo é mais presente.

Morder ou não morder, eis a questão, portanto. Se quem morde souber que é mais o agente do desejo que a vítima dele, sabe também que irá receber de volta um crescendo de prazer, que terminará, inevitavelmente, na consumação do corpo do outro. Como se só através da posse se pudesse entrar (e fazer entrar) no corpo de quem se beija. Daí, as marcas nos lábios não são os mais interessantes, mas sim as outras, tão mais secretas quanto forem desconhecidas para a vítima. E ao longo do dia, uma presença incómoda vai-se instalando. Presença essa que derivarará numa correria contra o tempo até ao objecto desejado.

Se quem morder o souber fazer, sabe também que não lhe será recusada nova investida. Não pode é confundir-se e oferecer-se de bandeja. O corpo, último reduto do prazer deve ser algo escondido e provocado. Não oferecido e disponÃível. Deve fazer parte de um jogo de sedução, em que a procura deve sempre suplantar a oferta, para que esta não se esgote e se fique a morder o ar.

sábado, novembro 15, 2003

Reanimação

Quando finalmente tenho um tempo, volto aqui a este blog e, ao fim destas semanas todas, apercebo-me que este melhor anjo cresceu tremendamente. Pois já temos comentadores habituais e 2000 visitantes... isto tudo na minha ausência. Ao menos não sinto a pressão do sucesso, não contribui para ele. Estou safa!
Apetece-me falar de algumas coisas postadas aqui. A questão dos encontros no cinema parece-me pertinente, de facto. Não é que alguma vez tenha pensado nisso, mas já que falam, pensarei. A conclusão a que chego é que o cinema é fundamental para uma relação amorosa. Seja em que etapa for da relação. Nas relações estáveis, penso que nem sequer há muita questão. O cinema é um espaço de respiração social, sem passar a ser por isso demasiado comprometedor ou claustrofóbico. É quase como se não saíssemos de casa, é um prolongamento da vida amorosa, como ver televisão no sofá, mas melhor porque está-se na rua. É tempo de qualidade.
No início de uma relação, é quase comemorativo. É andar com uma pessoa nova a fazer coisas velhas e habituais. Tem um lado quotidiano, que nos transporta para uma intimidade qualquer de códigos, hábitos e tempos. Tu agora pertences aqui, apetece dizer.
Antes de a relação ter início, quando só há um interesse não declarado, ir ao cinema é, de facto, mais excitante. Mas acho que nunca pode ser mau. Vamos ilustrar algumas situações:
1. O filme é escolhido pelas duas pessoas e é muito mau. Nenhuma das duas gostou. Pronto! É óptimo. Unem-se no embaraço de terem escolhido um mau filme, gozam sobre isso e prometem que para a próxima terão de escolher um melhor. Obrigam-se a isso, passa a ser obrigatório voltarem a encontrar-se.
2. O filme é escolhido por 1 pessoa e é muito mau para as duas. Melhor ainda. A pessoa que escolheu o filme pede mil desculpas, a segunda atira-lhe a cara o seu mau gosto a escolher filmes. A primeira diz que não, que aquilo nunca lhe aconteceu antes. A segunda enxovalha a primeira. A primeira diz que vai provar-lhe que consegue fazer melhor. Passa a ser um desafio. Temos material para pelo menos mais 2 saídas.
3. O filme é escolhido por 1 e a que escolheu gosta e a que não escolheu detesta. Aqui, há um problema talvez, mas não demasiado grave. A segunda, a que não gostou, vê-se na obrigação de mostrar à primeira o que é um bom filme. Leva a si a tarefa de dar a conhecer à primeira o que é bom cinema. Mais desafio, um pouco de conflito e, obviamente, mais química sexual.
4. O filme é maravilhoso! É certo que vão para a cama.

Confesso que fiquei um pouco preguiçosa agora no final. Mas deu para perceber a ideia. O fundamental, para mim, é que esteja presente o bom humor e a leve disputa, a discussão intelectual, a picardia verborreica. É a única forma que conheço de levar uma pessoa para a cama.
Finalmente, no escuro do cinema, há uma espécie de tensão sexual que fica sempre bem. Os pequenos toques que se dão sem querer na mão um do outro, os ombros encostados. Muito bom!
Adoro cinema e, por isso mesmo, acho necessário que, por vezes, o sacrifiquemos ou o usemos com intenções menos cinematográficas.
Por agora, é tudo!
Até breve.
Chuva

Chove muito. É um facto. Aqui em cima também temos infiltrações.

sexta-feira, novembro 14, 2003

Muito tempo fiquei ausente deste blog. Já tinha saudades. Como o meu bom amigo Tiago escreveu, o meu primeiro livro vai sair e ando num lufa lufa para trás e para a frente.
Mas isso agora não interessa. Interessa sim dizer coisas interessantes de blog.
Hum.
De facto, é um problema. Há alturas em que o mundo parece descolar-se de nós e ficamos realmente ausentes. Não sei nada do que se passa. Vou ouvindo histórias que me contam – felizmente trabalho num sítio público com colegas que lêem jornais – mas não sei das coisas do mundo de forma esmiuçada.
Pois bem, aquilo que é importante para o blog é mesmo a perspectiva de quem o escreve. Não só num blog, como na vida, é claro. A vida apenas interessa pela perspectiva que temos dela. E a minha vida, agora, que está tão iluminada por finalmente ter concretizado um dos maiores sonhos, está também manchada pelo peso da burocracia.
De facto, nunca, como nas últimas semanas, senti o peso brutal do Estado (mas não só) esmigalhando-se sobre mim. Aquilo que é aparentemente simples torna-se uma complicação que envolve dez deslocações, cinco cópias de 30 documentos assinados e autenticados e 15 telefonemas, apenas dois deles úteis e eficazes.
Enganei-me, portanto, quando disse que a vida era a perspectiva que temos sobre ela. Há um requerimento entre o nosso olhar e a vida, que não conseguimos preencher por ser demasiado incompreensível… As caixas para pôr os caracteres estão mal feitas e nada lá cabe. Numa palavra, bloquearam-nos.
OK, foi o post possível, agora que sou toda uma dispersão.

quinta-feira, novembro 13, 2003

Mickey

Todos os anos éa mesma coisa. Celebra-se o aniversário do Álvaro Cunhal, da independêndia de Angola... mas o Rato Mickey, cuja 1ª aparição aconteceu neste dias, corria o ano de 1912, é sempre esquecido. Ele é, no fundo, o S. Marçal das efemérides.

O S. Marçal é o 4º santo popular , depois de Stº António, S. João e S. Pedro. Acontece 4 ou 5 dias depois de S. Pedro e nunca ninguém salta a fogueira por S. Marçal.

E o Rato Mickey - que eu já injuriei em posts anteriores - que por ter aparecido num filmezinho chamdo Steamboat Willie marcou a história do cinema de animação é, ano após ano esquecido. Justiça lhe seja feitaHail to Mickey.

Em jeito de confissão, deixem que partilhe a minha 1ª grande gaffe: pois estava eu em plena aula de Meio Físico e Social, quando o professor nos conta que a história do mundo se contava em termos temporais, tendo em conta o nascimento de uma figura importantíssima. E eu: o rato Mickey.
Aquele grande rio Eufrates

Há um filme de 1998 que conta com a participação do Dustin Hoffman e do Robert DeNiro, em português Manobras na Casa Branca, que tratava da ficcionalização de eventos para que o povo acreditasse antes no que se passava na televisão e menos nos desastres do Presidente dos EUA.

Faltou um mestre de cerimónias ontem na partida dos "geninhos" para o Iraque. A chuva estava lá mas era fraca, a música que se ouvia não era Vangelis (quiçá devido ao uso abusivo socialista) mas podia ter sido Wagner, antes isso que o barulho do motor do avião que nunca mais arrancava e o ministro Figueiredo Lopes não tinha ar de vítima de guerra. Faltava-lhe o ar de Patton (onde estava Paulo Portas?)

Faltou, portanto, toda uma encenação, porque o efeito estava lá. As famílias chorosas, os voluntários esperançosos, a soturnidade, as cãmaras de televisão e o hangar imenso (à lá Casablanca). Até a ideia de que íamos cumprir o que os italianos haviam falhado.

Haja quem encene este país.

quarta-feira, novembro 12, 2003

Pré-publicação

A Ana, ilustre convidada deste blog, vai lançar dia 21 deste mês o seu 1º livro, após um imenso trabalho dramatúrgico nos espectáculos em que trabalhos. Chama-se, o livro, EUBARRATUBARRAMIM, e escreve-se assim na badana do dito:

Quantas faces tem o amor? Como se expressa ele?Cinco discursos emocionais, cinco formas de amar, cinco caminhos, cinco personagens – Augusto, Benjamim, Clarissa, Daniela e Eduarda.
Vidas que se tocam. Histórias contadas como uma corrente, na primeira pessoa. Um eu de pessoas diferentes. Um tu que nunca está encerrado.
O desejo, o amor, as relações. Como tudo isso nunca fica no mesmo lugar, como as posições de cada um se vão alternando, trocando e superando.


Vergonha

É por estas e por outras que tenho sempre muito medo de escrever um post no meu blog. Se há quem o faça melhor para que incomodar os restantes?
Histórias de amor

O que mais me apraz nesta história toda do príncipe, é ver como as mulheres que antes se batiam pela igualdade de oportunidades, direitos e garantias, rapidamente ficam seduzidas e deleitadas com a ideia de que Letícia Ortiz vai abandonar a profissão para se dedicar ao casamento. O que me leva a perguntar: querem todas as mulheres ser princesas e por não o poderem ser começam a trabalhar?
Para uma história completa

Também já tinha reparado no desastrado estado a que chegaram os painéis do MRPP ali em Alcântara. O Rui sugere que sejam elevados a património municipal e eu concordo com ele. Não faz sentido que não se preserve um elemento de memória da luta por valores fundamentais. Em memória dos que por ela lutaram, os ilustres - onde se inclui o nosso Primeiro, a infatigável Ana Gomes e o elucidado Garcia Pereira - e os outros, falta salvar esse bocadinho de história.

No tempo de Jorge Sampaio à frente da CML foi feita uma recuperação, mas já lá vão uns anos. Caramba, Dr. Santana, já viu o potencial que tem ali. Olhe os jovens das Docas a verem o cartaz: "Já reparou que aqui recuperamos a história?"

Vá lá, um abaixo assinado.
O regresso

Ouço dizer, à boca pequena, que a SIC Radical começou a passar o Twin Peaks. E logo agora que tinha acabado de pagar todas as consultas com a psicanalista.
Do alto do mundo

Estreou ontem na SIC Notícias o debate mensal entre Mário Soares e António José Teixeira. Já só no final do programa é que a razão de ser da coisa se desvendou. Soares dixit: "a notícia do casamento do príncipe Filipe é tudo menos um assunto frívolo" E eu então percebi que o que ia contecer todos os meses era mais um espaço de opinion making com o embelezamento da palavra "debate".

Depois da coluna no Expresso, dos recados internos, da proto-candidatura do filho à liderança do PS, do espaço europeu, o ex-presidente da República não só se fará ouvir mais uma e outra vez como, tenho para mim, será o único responsável pelo excesso de notícias de si originadas. A intriga palaciana e os golpes de asa do "ex-monarca" continuam a bater fundo e a fazer render histórias. Resta saber se o impacto de cada intervenção de Soares, quando feita a conta-gotas e de forma precisa, não tem muito mais impacto que uma presença obrigatória.

O efeito foi soporífero porque repetido.
Amor a quanto obrigas...

Em jeito de resposta, o Bruno diz que a palavra "paixão" encerra em si mesma um compromisso. Tenho, para mim, a ideia de que o compromisso não é tanto o chegar-se ao amor mas o fazer tudo para que não falhem as hipóteses de lá chegar. O estabelecimento de um objectivo primário, no desenvolver de uma relação é, antes de mais, uma falácia. E não só pressupõe que se conhece o que se pretende, como antes proíbe todo e qualquer desvio. Daí deriva a dificuldade de se poder dizer "amo-te" antes de passadas as primeiras provas. Dizer-se "amo-te" assim, sem mais é carregar a relação, porque embrionária, frágil e desprotegida, de um peso que não encontra libertação.

A paixão é, por isso, um sentimento de alma para o qual são convocadas uma série de sensações-teste que porão à prova a existência de amor. E quando lá se chega, fica a dúvida: toda a paixão deriva em amor? O amor matou a paixão? É possível estar-se apaixonado e amar-se ao mesmo tempo?
Um dia sem autocarros

A greve da Carris deveria ser aproveitada para repensar todo o modelo europeu de promoção da utilização do transporte público, leia-se A Semana da Mobilidade ou Dia Europeu Sem Carros.

Está mais que provado que a utilização do transporte público como alternativa ao individual é, nos dias que correm, uma utopia. Então sofre-se tanto para se ter a carta e gasta-se o parco salário a pagar o seguro do carro para se deixar a viatura à porta de casa? Não me parece que convençam alguém disso.

No entanto, hoje, Lisboa estava cheia de gente nas ruas, a subir e a descer calçadas, a atravessar passadeiras... os condutores de carros saíam para conversarem uns com os outros, enquanto a fila não andava... os taxistas andam satisfeitos... os motoristas não são espancados...é, em suma, um encontro de pessoas, o fim do individualismo, da ideia de isolamento que persiste nas grandes cidades. Não existirem autocarros, não só substitui horas num ginásio como se vêem as coisas com mais atenção. Eu proponho este dia uma vez por mês. A ver se não melhorávamos todos.
Cavalleria Rusticana

Nasiriyah é uma cidade ainda sem paz, onde a força das armas impera e o terror é uma constante. Os militares internacionais arriscam as suas vidas, em nome de um conflito protegido pelos ideias de ordem mundial. A ONU reduziu a sua presença, a Cruz Vermelha foi bombardeada e vai-se embora, outras tropas ameaçam abandonar o território, longe que está de ser controlado. Todos os dias morrem soldados e todos os dias a batalha que parecia estar ganha à partida se revela mais difícil.

Hoje segue para o Iraque o contingente especial que Portugal preparou, no âmbito da colaboração aliada. São 124 homens e 4 mulheres, a serem preparados desde há meses e com os ânimos redobrados. Camões, os Lusíadas e a Nossa Senhora da Guarda abençoam-nos. As notícias que de lá nos chegam apresentam um território de medo e receios. Eles estão confiantes. Nervosos, mas confiantes.

Este malfadado desígnio nacional - o de termos que dar o nome pelos disparates dos outros - atinge proporções alarmantes. Na mesma semana que os profissionais da polícia se queixam que pagam do seu próprio bolso as fardas que usam, que os telemóveis ao dispor são carregados com dinheiro próprio, que as armas não funcionam sempre, segue para o Iraque um grupo de "geninhos" dispostos a assegurar o que os outros já recusaram fazer. Vão fazer acompanhamentos de comboios e serviço às populações. As mesmas que agora se sentem ocupadas pela neo-liberdade.

Eu espero, sinceramente, que Bush não leia os jornais portugueses. Porque se souber que os nossos "bravos" são todos voluntários, ainda lhe dá uma de Sevinate Pinto e diz que correu tudo mal por falta de preparação nossa.

terça-feira, novembro 11, 2003

Envelopes

O Pedro indigna-se, mas a verdade é esta: onde é que se encontram envelopes dos simples, brancos e funcionais? Os correios já não os vendem, os supermercados é só ao maço, e os azuis imprimem uma urgência, por vezes desnecessária. Às vezes quer-se só escrever uma carta. Ainda que não nos respondam.
O cinema não é compatí­vel com o amor, dizem...

A propósito da belí­ssima análise que o Bruno faz, recordo-me do que o James Cameron dizia: nunca convidava ninguém de quem gostasse para ir ao cinema, porque então não veria filme nenhum. Eu estou com ele. Das vezes em que convidei alguém de quem gostava para ir ao cinema, a coisa não corria bem. Ou porque o filme era mau - e logo aí­ se estabelecia uma diferença de gostos (inultrapassável numa primeira fase porque, de contrário, anulamos os nossos gostos para agradar à  outra pessoa) e um incómodo prazer - ou então a sessão estava cheia.

Depois, porque não se pode escolher um filme óbvio. Se for uma história de amor, ainda nos acusam de pressão; se for um filme de aventuras, avalia-se o grau de sensibilidade; se for um filme europeu, as palavras ficam sem som (ninguém aguenta a pressão psicológica num primeiro filme). Daí, a minha sugestão passar por um filme infantil. É bem mais leve e relaxante.

Não querendo entrar em pormenores, lembro-me de ter escolhido o Sozinho em Casa 3, no Colombo, para uma conquista que há 3 anos me atormentava. Não correu bem. depois, escolhi o filme do Alfonso Cuáron, Great Expectations, no Londres - ainda este tinha uma só sala e dos poucos cinemas românticos de Lisboa - mas ela tinha lido o livro e indignou-se com o mau resultado. As minhas mãos suavam, queriam escorregar para o cheiro dela, ansiava pelo intervalo... e ela indignada. A coisa correu melhor aí. Durou uns meses mas acho que não vimos mais filme nenhum. Há 3ª foi de vez, Truman Show no Monumental. A coisa correu muito bem. Até ao dia em que acabou.

Depois disso, passei a escolher exposições, jantares, vinhos e passeios. O cinema não me ajudou lá muito nas conquistas. No escuro pode pensar-se tudo, menos acertar no que a outra pessoa quer. Numa exposição ou num jantar, o constrangimento é maior e a tensão liberta outros sentidos. No entanto, anseio pelo dia em que alguém aceite ir ao supermercado comigo, em jeito de 1º encontro.
A manhã seguinte (VI) - Fotografias


Aqui, as imagens do Encontro de Blogs. Para mais tarde recordar...

segunda-feira, novembro 10, 2003

A lei dos amantes (10)

sangue frio
Momento zero

No sábado fui à inauguração de uma exposição de fotografia no bar Bicaense, ali na rua do elevador da Bica, de um amigo chileno chamado Julian Andres. É um trabalho de supressão do supérfulo para chegar ao outro lado do objecto exposto: o que não se vê.

Poderá parecer um elogio descarado, embuído que possa estar desse nevoeiro que é a amizade, mas, na verdade, o trabalho do Julian acaba por nos transportar para o momento zero da fotografia: aquele que fez o fotógrafo carregar no botão. Que poderá ele ter visto? Mais, que deve ele ter sentido para querer perpetuar aquela imagem?

Deixar-se partilhar, significa que o Julian acredita que o seu trabalho está incompleto... que continua no espectador. E que ele lhe devolve essa pergunta: porque quiseste marcar o que viste?

Mergulhar no universo que o Julian nos expõe é, sobretudo, querer acompanhar com ele a descoberta de um outro sentido para a imagem. Será antes o início de qualquer coisa do que a fixação dessa mesma coisa.

A exposição está patente de terça a sábado, das 20h às 02h00. Vão ver.
Fim de semana

Mudar de casa perdeu quase todo o encanto... quase que se tornou numa ciência. Ou antes, uma prática que de tão regular se tornou instantânea. E agora não deixa marcas, não causa emoção, não provoca novas sensações. Preciso rapidamente redifinir tudo. Corro o risco de me tornar um autómato.
Hora de ponta

A ser verdade o que dizem, as minhas orelhas fervem mais à noite e ao fim de semana. Será porque as tarifas são mais baixas?

sábado, novembro 08, 2003

Mudança

Estou a mudar de casa. Um novo mês, uma nova morada. Os que acharam que exagerava e utilizava metáforas no texto do Encontro,podem agora acreditar.

quinta-feira, novembro 06, 2003

A manhã seguinte (V) - Resíduos

Os altruístas organizadores começaram a recolha do Encontro de Blogs. Partes de um todo para matar de inveja quem faltou.
Kill Bill

Fui ver o último de Tarantino. Fui vê-lo desconfiado, suspeitoso, céptico, descrente. E desviei-me de cada golpe como se me fossem dirigidos.

Confesso, desde já, que não gosto do Tarantino. Como não gosto do Spielberg, do Lars von Trier, do James Cameron ou do Jean Pierre Jeunet. E, no entanto, não deixo de os ver. São uns virtuosos. E como eu não resisto ao charme da coisa, cedo, contrariado e rezingão. E foi por isso que fui ver o Kill Bill. Por isso e pela Uma Thurman, que desde que fez de Vénus nunca mais me saiu da memória. Oscar com ela imediatamente. O mundo inteiro aos seus pés. Maldito Ethan Hawke que não só lhe fez um filho como ainda a deixou. Desgraçado. Mas o Kill Bill... pois...

Baralhar e voltar a dar, é o que é. Do Tarantino incomoda-me a citação. Há que saber citar e não mostrar que se conhece. Ora ele tanto confunde uma coisa com outra como acha que o espectador é parvo. Eu não sou, mas a mim ninguém me perguntou nada. Confesso, no entanto, que o Kill Bill me fascinou. Confesso, também, que tem tudo a ver com o espírito com que fui ver o filme. Apetecia-me ver porrada e sangue, sem explicações filosóficas, e em dia de estreia do Matrix, dei-lhes um murro no estômago e acreditei no que o Tarantino me prometia. E não é que nem parece o mesmo de Pulp Fiction ou Jackie Brown? Aliás, a única forma de relacionar os filmes dele é porque se sabe que ele é incapaz de se fazer cumprir ao plano que estabeleceu. Tarantino não tem unhas para a guitarra que quer tocar. Salva-o Santa Uma que carrega o filme com o seu ar negligé e à qual nós só desejamos sorte, muita sorte.

A história deste filme é quase um trailler de um que há de vir. A Noiva é deixada em coma no dia do casamento e quando acorda (mas porque raio tem a rapariga de acordar sempre daquela maneira, já no Pulp Fiction nos saltava no colo – e eu da cadeira sem saber o que fazer com tal oferta) vai procurar vingar-se dos que a maltrataram. Daí ao fim do filme vão duas horas de murros, espadas e sangue, muito sangue a jorrar de braços, pernas, cabeças. Vermelho, muito vermelho e muito irreal. Tão irreal que se acredita.

Quem não quiser esperar o melhor é não ir ver este filme. Porque, na verdade, nada acontece a não ser aproximar-se do inicio do volume dois. Porrada e muita porrada. Tanta porrada que leva Uma Thurman. E que bem que ela leva porrada. Sempre pronta a levar mais, como uma deusa que se preze. Enfim... rendido, saí do filme, limpei-me do sangue que me caía do corpo e hesitei entre ser a espada que ela carrega ou o corpo que ela mata. Para Uma, duas. Dois, neste caso. Um filme que é uma personagem. Ela que é só Uma. A única. A Noiva. Morra Bill morra pim.
A lei dos amantes (9)

Nunca ninguém se apaixona de manhã. O dia ainda está por acontecer. Mas é mais à tarde, já quase noite, quando os compromissos do dia seguinte nos obrigam a madrugar que o amor surge. E aí, como se isso fosse uma chamada à realidade, temos que regressar ao frio marmóreo do quotidiano e suportá-lo até a um outro fim de dia, em que o calor do amor volta a surgir. Levante o dedo quem já se apaixonou de manhã. Levante, agora, o dedo quem já se apaixonou perto da meia noite e no dia a seguir partia em viagem.
Chavela Vargas

Apareceu no filme Frida, a cantar para uma Selma Hayek devenu Frida Kahlo, mas antes disso era voz em filmes do Almodóvar. E antes mesmo, presença no cancioneiro dor de corno espanhol. Um dia, espantado, alguém me disse que conhecer Chavela Vargas era quase tão natural como estar atento ao que se passava no mundo da música.
Mexicana, rugosa, seca e amargurada como só o mezcal nos deixa. Obrigatório para as noites frias dos corações quentes. Chavela Vargas. Só o nome é todo um programa estético.

quarta-feira, novembro 05, 2003

Pressão

Próxima estação Telheiras. Pede-se o favor de sairem das carruagens. E depois outra vez, e mais alto, como se não tivessemos ouvido: Os senhores passageiros devem abandonar as carruagens.
Assustados, os passageiros saem das carruagens. E a voz insurge-se mais uma vez. A multidão, assustada, atropela-se na escadaria.

terça-feira, novembro 04, 2003

Kundera

É a segunda vez que me acontece. Não consigo atravessar o Milan Kundera. A Valsa do Adeus ficou a mais de meio e A Identidade para lá caminha. O que se passa?
O amor inventado

O Bruno escreve sobre o amor e as suas definições. Escreve e diz que a pergunta não deverá ser: Estás apaixonado/a?

Há uma questão premente. Apaixonar vêm de paixão. É paixão a mesma coisa que amor? Não deveria ser antes: Estás enamorado? Para depois se poder passar à pergunta seguinte: Estás amantizado?
Lolita ou o perverso nas crianças

Tem razão o J quando diz que "o que éque a menoridade tem a ver com a pedofilia? A maioria das pessoas tem as suas primeiras experiências sexuais antes dos 18 anos. Anda por ai' uma tendência perigosa a alargar o conceito de pedofilia: Éabuso sexual de pré-puberes, portanto, no maximo, com uns 14 anos.", a propósito do meu post anterior. Eu mesmo fiquei chocado com a ideia conservadora que passava. Na verdade, acredito que "coisa inocente" éalgo que não se pode aplicar a todas as crianças. O caso da Lolita é, como referiu o Pacheco Pereira em comentário dominical, uma história de amor, das mais profundas.

O filme vai passar na Cinemateca, dia 10 às 19h, e fala de tudo menos de pedofilia. Aliás, criança é termo que não se pode aplicar à  personagem de Shelley Winters (ainda que ela tenha vindo dizer mais tarde que precisou de um psicólogo para a ajudar o passar o trauma).

Mea culpa, então no que poderá parecer um conservadorismo meu. Eu até torço para que o Fred não morra. Entretanto, aqui está um excerto da Lolita, versão blog e aqui em versão lusa.
Paraíso Perdido

Na rua Ivens, ao Chiado, um arrumador de carros, de ar andrajoso e decadente lia o Paradise Lost do John Milton, versão inglesa de bolso. O dono do carro teve que estacionar sozinho.

segunda-feira, novembro 03, 2003

A manhã seguinte (IV)

O Bruno escreveu sobre o Encontro de Blogues. E escreveu bem. O Gonçalo também escreveu. Bem, também. A Catarina, o Retorta, o PedroF, o Pulha... Enfim, todos escreveram, o que me parece simpático e sobretudo cria uma nova rede. Agora vêem-se comentários de uns e de outros... a malha vai-se apertando.

Mas o Bruno exagerou quando disse: "O Tiago (melhor anjo) apresentou um belo texto de cariz poético onde se expõem as ansiedades, desejos e realizações que a marcam o percurso de quem se dedica a ser blogger por lealdade a uma busca que se quer incerta. ". Comentei isso com ele.
Mãe e Filho

Passa hoje no Cine 222, repetindo amanhã, um belíssimo file de Alexander Sokurov, imperdível a todos os níveis. Vi-o há uns anos e ainda hoje me arrepio com a lembrança. Silencioso, contemplativo, seco e duro. Absolutamente obrigatório.
Horas, a quantas andas?

A ideia é fazer chegar à Assembleia da República um abaixo assinado de carácter nacional para que se crie o Ano da Pontualidade. Está em causa a crónica incapacidade de chegarmos a horas, respeitarmos horários, prevermos situações, sermos mais atentos. Assina-se aqui para chegar às 10 mil assinaturas. Mal não faz.
A constituição, versão direita

Bem sei que são ainda propostas e que, sobretudo, ainda vão ser sujeitas a acordos inter-partidários. Mas não deixa de ser preocupante que algumas das propostas do Partido Popular ponham em causa direitos fundamentais das pessoas e, sobretudo, atentem contra coisas que fazem parte da criação de um bem estar permanente. Da lista principal, publicada pelo PÚBLICO, na edição de sábado, destaco, assustado, o seguinte:

-Inviolabilidade da vida humana desde o momento da concepção;

o aborto não pode ser encarado como um método contraceptivo, mas devem ser criadas condições para que a clandestinidade acabe e as mulheres não acabem por morrer com a operação. É uma questão social e não política. A voz das mulheres devia fazer-se ouvir aqui.

-O Estado deve impedir as concentrações de empresas de comunicação social “que afectem a livre expressão e confronto das diversas correntes de opinião”;

A nomeação de Fernando de Lima fará já parte deste processo? E em que medida é que a nomeação de Luís Delgado para a Lusa, a destruição da TSF, o fim da RTP 2 se encontram aqui?

-O concurso público deixa de ser regra geral para a entrada na função pública;
-O direito à greve “não pode prejudicar o direito ao trabalho daqueles que o pretendem exercer”;
-Criação das associações de empregadores “para defesa dos direitos das entidades empregadoras”;
-Eliminação dos artigos referentes à participação dos trabalhadores na gestão das empresas;


Parece-me que a clivagem entre entidade patronal e funcionários se acentuará a partir do momento em que, aos trabalhadores for condicionada a hipótese de porem em causa as acções dos patrões. Em vez de se proporcionarem condições para que a produtividade aumente, a partir da partilha de responsabilidades, pretende-se que o autismo seja cada vez maior dentro das empresas. E a ideia de que uma equipa constituída somente por escolhas directas dos superiores irá ajudar a um melhor funcionamento das empresas parece-me falacioso. Uma nova espécie de corporativismo negativo poderá começar a fazer-se notar.

-Acaba o direito à habitação;
-Acaba com o princípio da gratuidade progressiva de todos os graus de ensino e com o princípio de gestão democrática das escolas;


Eu parece-me que ouvi o Presidente da República dizer que a prioridade deveria ir para o ensino básico e secundário, mas pode ser ilusão minha. A educação, como a saúde, não é uma fonte de riquezas, mas antes um investimento. E essa é a obrigação do Estado, a de formar novos e melhores cidadãos. O futuro não é amanhã.
E em relação à habitação, faz parte da construção de pessoas mais capazes, menos desprotegidas e confiantes ter-se uma casa. Com as devidas reformas, recusar o direito à habitação é quase tão primário quanto a ideia de “cada um faça por si”

-Acaba com a proibição de referendos simultâneos com eleições.

E quando a lei não se ajusta ao que se pretende, mude-se a lei. Eu já achava que Portugal deveria fazer força na União Europeia para impedir que as eleições ocorressem em pleno Europeu de Futebol, agora com o referendo, não se imagina que espécie de campanha se possa fazer.
Os dois lados da mesma moeda

No seu comentário habitual à TVI, Marcelo Rebelo de Sousa elogiou a entrevista que o Presidente da República deu na passada semana à RTP, ao PÚBLICO e à Rádio Renascença. E disse até que era, muito provavelmente, “a” entrevista da vida política de Jorge Sampaio. A qualidade da entrevista foi, aliás, também elogiada pelo pivô do Jornal Nacional, José Carlos Castro. Mas, o comentador mostrava-se preocupado com o facto da entrevista ter sido pouco vista e de como esse facto reflectia o pouco interesse que os políticos suscitavam nos portugueses. Pouco depois, o apresentador pedia a opinião de Rebelo de Sousa acerca das eleições do Benfica e este salientava a forte exposição mediática a que a TVI não era alheia, como se sabe. Entredentes, José Carlos Castro também enfatizou a questão. Pergunto, então: o pivô está do lado da linha editorial da TVI que suga a informação e a perverte em termos de conteúdo, ou ainda restam jornalistas profundos na redacção da TVI?
The greatest star on earth

Victor Peter. Meu Deus, que dizer. Obrigado Herman, pela memória. A juventude de tantos de nós nunca mais foi a mesma depois de sucessos como “Oh Ivone, goodbye my love” ou “Paula”. Agora, todos em conjunto:

Paula
Eu sofro por você
Paula
Não posso mais chorar
Paula
Sou solteiro e bom rapaz
Paula
Seu amor jamais esqueci


ou

Cho-minhom-manhon
Watudu
Cho-minhom-manhon
Watusei

Oh Ivone, oh Ivone
Oh Ivone,
Goodbye my love

domingo, novembro 02, 2003

Duvidas

Hoje o computador nao me ofereceu acentos. Deixo a historia fazer-se assim ou altero-a?
A letra de Agustina

E pequena, apertada e azul, E direita,sem curvas e erros.E classica e antiga.Como ja nao se escreve. Podia ler-se sem ser dactilografada. E e tao pessoal que ninguem duvida que as palavras impressas se sintam orgulhosas da sua origem.

ver Revista Ler, n.º 60,p. 27
A lei dos amantes (8)

... alguem que se demore entre o champoo e o cabelo, que leia duras antes de adormecer, que sirva vinho aquecido a desoras...
As moscas

Desde que atingi 40º de febre, este verao, que as moscas nao me largam. Ja percebi a mensagem...
Atras dos olhos, os livros (II)

Uns tempos depois da FNAC aparecer em Portugal, começou a passar um anuncio que enaltecia as vantagens de se poder ler sem comprar e,melhor, sem ser incomodado. E, de facto, assim e. Mas, mais que ler os livros, deixarmo-nos estar a observar as pessoas e mais envolvente.

Ha um filme do Woody Allen -nao sei se o Annie Hall -em que ele e a Diane Ketaon se sentam no Central Park e começam a comentar quem veem passar. Assim mesmo, comecei a olhar a minha volta:

- aquele rapaz que folheia dicionarios, quse sem os abrir, procura uma palavra para definir o que?;

- ha uma mulher encostada a secçao de literatura infantil, com 2 livros na mao, mas nao vejo criança nenhuma a sua volta;

- o homem sentado ao meu lado, de alinaça no dedo, nao quer atender o telemovel e vira furiosamente a pagina do livro;

- ha um outro homem que se passeia entre os expositores, enquanto fala ao telemovel. Se estivessemos em silencio, a voz dele perturbaria a leitura...mas no outro lado da loja uma mulher fala, tambem, ao telemovel. Por momentos parecem responder-se.

Fingi parar de ler o que lia e disfarcei nao estar a observar tanta gente.

Atras dos olhos,os livros (I)

Na feira da ladra, um homem despejou centenas de livros num tapete e começou a vende-los a 1 €. Lembrei-me dos porcos deixados no Terreiro do Paço, das laranjas e maças dadas na Baixa e dos rebentamentos de condutas de agua. Lembrei-me, tambem, de uma cabra que escorregou monte abaixo na Madeira.

Nao fui capaz de salvar livro nenhum.
O silencio

Pergunto-me se nao somos tambem feitos do que nao dizemos,do que nao escolhemos, do que nao queremos... A nossa historia e tambem a historia do nao acontecimento?

Assim, sera possivel fazer-se um blog sem posts? Havera forma mais bonita de se dizer algo que dize-lo em silencio?
Do castelo

Caiu-me em cima da perna um pequenino ramo depinheiro e eu pensei: "Caramba, estou no Castelo de S. Jorge." Repito: no Castelo de S. Jorge. Domingo, fim da manha, quantos lisboetas (para falar so nos que moram na capital) foram recentemente ao Castelo?

Eu confesso que o facto de morar ha 3 anos sob a sua alçada nao me fez visita-lo mais vezes. Alias, acho que so o fiz uma ou outra vez, e sempre partindo de outros pontos da cidade.

E, de repente, tive que pousar o jornal e olhar para Lisboa, uma LIsboa que fez ontem anos que desabou. E qualquer dia e dia de terramoto. 8Devia ser, tambem, feriado municipal o 1 de Novembro)

Nao ouvi falar em portugues enquanto estive no Castelo. Os turistas, ate de linguas impronunciaveis, deliciavam-se com a beleza cinzenta da cidade; com o silencio reconfortante e envolvente de Lisboa; com o quadro vivo que lhes e oferecido.

E la em baixo, a sombra do Castelo que definiu a cidade, milhares continuaram o seu dia sem olharem a colina.Ou melhor, sem verem a colina onde se ergue o Castelo, sabe-sela por quanto tempo.

sábado, novembro 01, 2003

Dia nim

Tirei o dia para fazer doce de abóbora com noz. Qualquer pensamento mais profundo anulará a beleza da coisa.