Sessão contínua III
Lost in Translation
Coisa secreta. Coisa nossa. Coisa simples. Coisa bonita. Coisa singela. Coisa estranha. Coisa entranhada. Coisa distante. Coisa que choramos. Coisa que sorrimos. Coisa que vemos. Coisa que conhecemos. Coisa que exaspera. Coisa que comove. Coisa que reconhecemos. Coisa tua. Coisa perdida. Coisa dita. Coisa minha. Coisa para mim. Coisa que não te dou. Coisa que espero. Coisa que te ofereço. Coisa que te peço. Coisa que disfarço. Coisa fora. Coisa aqui. Coisa outra vez. Coisa sempre. Coisa dentro. Coisa-pele. Coisa sim. Coisa.
Que voz tem a tua língua?
Que ouço quando me falas?
Que digo quando te vais embora?
Que era antes de ti?
Que és aí ao lado?
Que mão segura a minha?
Que sabe o beijo que te quis dar?
Que cantas?
Que vês?
Agora tens-me. Agora não.
E agora?
sexta-feira, fevereiro 27, 2004
Sessão contínua II
21 grams
Diz o Tiago Araújo sobre a cor deste filme: "A cor, nas tonalidades certas, no volume certo, pode salvar uma história. Em 21 Gramas, o grão ligeiro da imagem confere uma grande profundidade às cores e aos personagens. E as cores profundas de uma paisagem urbana intimamente americana libertam um filme onde se parecem conjugar demasiadas construções recicladas de outros filmes: a estrutura narrativa, muitos dos pormenores da história. Sean Penn, Benicio del Toro, Naomi Watts, mergulham profundamente na cor. "
Tal como noutro filme, também aqui a cor assume papel primordial e parece que define melhor as personagens que os outros elementos que nos vão sendo dados. Na verdade, este dispositivo nem sequer é novidade. Já em Traffic a fórmula era utilizada, mas se ali as histórias aconteciam paralelamente e a determinada altura se juntavam, aqui, o dispositivo permitiria ser consequente, ou seja: contar uma e depois outra e depois outra. É que não há mais história depois desta que é contada. E isso sente-se. Sente-se que a formula encontrada para contar a história existe para a suportar e não o contrário e esse efeito anula a surpresa, o climax, a tensão... poder-lhe-íamos chamar o anti-climax já que tudo se prevê, tudo se desconfia, tudo se liga. O filme é deixado ao abandono da força das interpretações e toma-se nelas para não dar mais. É pena, e é pena porque gostávamos de acreditar que o filme é mais importante que as personagens e que elas só existem porque se quis fazer desta uma história.
Sean Penn é portentoso, mas é-o sempre. Entre Mystic River e 21 grams , a escolha é difícil creio, mas entre um pai traído e um homem perdido, escolho o primeiro. Naomi Watts é secreta, entusiasmante, difícil e perturbadora. Benicio del Toro é pesado, presente, impenetrável e ambíguo. Mas depois, mergulhados na cor, são deixados sozinhos. E a isso olhamos desconfiados.
Das razões teóricas e das forças filosóficas subjacentes, pouco sinto. Há o caos, mas até ele procede a uma norma. Marx, aqui, não tem razão. Quando se aproxima o caos, tentamos fugir. E quando não se sabe sair do caos, fica-se nele. E nele, há duas soluções: a implosão e a explosão. Aqui ficam a meio termo. Quase que se quer acreditar que o último suspiro de Sean Penn é de alívio. Implodiu. Os outros ficam. Mas sem nada para dizer. E nós ali tanto tempo a querer ouvir.
21 grams
Diz o Tiago Araújo sobre a cor deste filme: "A cor, nas tonalidades certas, no volume certo, pode salvar uma história. Em 21 Gramas, o grão ligeiro da imagem confere uma grande profundidade às cores e aos personagens. E as cores profundas de uma paisagem urbana intimamente americana libertam um filme onde se parecem conjugar demasiadas construções recicladas de outros filmes: a estrutura narrativa, muitos dos pormenores da história. Sean Penn, Benicio del Toro, Naomi Watts, mergulham profundamente na cor. "
Tal como noutro filme, também aqui a cor assume papel primordial e parece que define melhor as personagens que os outros elementos que nos vão sendo dados. Na verdade, este dispositivo nem sequer é novidade. Já em Traffic a fórmula era utilizada, mas se ali as histórias aconteciam paralelamente e a determinada altura se juntavam, aqui, o dispositivo permitiria ser consequente, ou seja: contar uma e depois outra e depois outra. É que não há mais história depois desta que é contada. E isso sente-se. Sente-se que a formula encontrada para contar a história existe para a suportar e não o contrário e esse efeito anula a surpresa, o climax, a tensão... poder-lhe-íamos chamar o anti-climax já que tudo se prevê, tudo se desconfia, tudo se liga. O filme é deixado ao abandono da força das interpretações e toma-se nelas para não dar mais. É pena, e é pena porque gostávamos de acreditar que o filme é mais importante que as personagens e que elas só existem porque se quis fazer desta uma história.
Sean Penn é portentoso, mas é-o sempre. Entre Mystic River e 21 grams , a escolha é difícil creio, mas entre um pai traído e um homem perdido, escolho o primeiro. Naomi Watts é secreta, entusiasmante, difícil e perturbadora. Benicio del Toro é pesado, presente, impenetrável e ambíguo. Mas depois, mergulhados na cor, são deixados sozinhos. E a isso olhamos desconfiados.
Das razões teóricas e das forças filosóficas subjacentes, pouco sinto. Há o caos, mas até ele procede a uma norma. Marx, aqui, não tem razão. Quando se aproxima o caos, tentamos fugir. E quando não se sabe sair do caos, fica-se nele. E nele, há duas soluções: a implosão e a explosão. Aqui ficam a meio termo. Quase que se quer acreditar que o último suspiro de Sean Penn é de alívio. Implodiu. Os outros ficam. Mas sem nada para dizer. E nós ali tanto tempo a querer ouvir.
Sessão contínua I
Monster
É um filme confuso e ambíguo este Monster. Se, por um lado não vai além do boneco e da pincelada a traços largos de uma história, por outro não nos permite sequer escolher entre compaixão ou nojo, pela figura que Charlize Theron interpreta. Talvez se formos por partes: de facto, quando os actores se transformam completamente, é dificil acreditarmos que há algo mais para além da máscara. Há excepções, claro: DeNiro (Touro Enraivecido), Day Lewis (O meu pé esquerdo), Di Caprio (What's eating Gilbert Grape?) e depois, quando há mulheres as máscaras são mais interiores. O nome que me vêm à cabeça é sempre Meryl Streep que se transmuta mas não se acredita que aquilo não lhe saia com quem bebe um copo de água. Ora o caso de Charlize Theron é impressionante por isso mesmo, ambíguo quanto baste para nos fazer confundir o exagero da personagem e a necessidade de credibilidade.
As suas curvas e pele cor de areia, lábios húmidos e olhos verdes inebriam, mas onde estão eles? Neste fime foram rapados, engordados, encardidos, mal tratados... em nome da transformação completa. Consegue-o? Sim, parece-me. A primeira vez que a vimos saltamos da cadeira. E saltamos porque antes ouvimos a voz dela, quente e sensual, mais engrossada e cínica. mas ainda assim suficientemente reconhecível. Depois o choque. É bom que não se chegue atrasado ao filme. Molhada, seca, para lá do desespero. Depois Theron perde-se, por vezes, em gestos e trejeitos mais rudes e pouco críveis que nos fazem desconfiar da necessidade dos mesmos e dizemos: oh, estava tudo a correr tão bem, não te faças aos prémios rapariga...
Se há um filme que a suporte e alivie tamanho peso, a resposta é que não há. E isso parece-me assumido. Não há filme para lá da personagem de Charlize Theron porque a ideia é ela ser o filme, a razão de ser, o fim e o princípio. Assim, faz sentido uma interpretação onde não há história? Faz sentido criar-se uma ficção quando se quer mostrar uma realidade? Qual o sentido de um filme - logo uma ficção - se nos quer remeter para a realidade. Ora, aqui é que a confusão se instala. Não é um filme redentor, que procure a compaixão ou entender as razões. E quando tenta a explicação, logo nos mostra a irracionalidade. A única pena que pode causar é o facto de desejarmos que ela seja apanhada para que não sofra mais. E isso não é sofremos por ela, é sofrermos com ela. E isso nem nos choca. Aillenn Wuornos não é uma mulher que possa estar à solta, à deriva... precisa ser controlada porque não tem nada, não lhe resta nada e ela não sabe estar sozinha, cuidar de si, ser adulta. E é aí que temos pena. Não por ela ter sido violada, espancada, ignorada, ter falta de amor. Mas por não ter força de sobreviver. E aí, nós podemos perceber que às vezes não basta encontrar forças onde elas não existem. Às vezes não se é capaz de mais.
É nessa altura, que coincide com o final do filme, que Aillen Wournos diz à amante Sellby (inexpressiva, mimada e inconsequente Christina Ricci) que tudo o que fez foi por amor e que assumirá todas as culpas. Que mesmo que ela não perceba porquê - porque nunca ninguém percebe a importância que pode ter para nós determinado olhar, só a presença, a palavra certa - o amor falará mais alto. E isto é feito sem consessões à piedade, ao sentimento... o olhar frio está lá, a certeza está lá, a razão está lá. A confusão instala-se. O que se deve sentir por uma muler assim? O que fazer a uma mulher assim?
Acabou o filme e eu saí da sala. Mais à noite apercebi-me que ainda carregava o peso dessas questões. Quase que sentia a sujidade do corpo dela no meu.
Monster
É um filme confuso e ambíguo este Monster. Se, por um lado não vai além do boneco e da pincelada a traços largos de uma história, por outro não nos permite sequer escolher entre compaixão ou nojo, pela figura que Charlize Theron interpreta. Talvez se formos por partes: de facto, quando os actores se transformam completamente, é dificil acreditarmos que há algo mais para além da máscara. Há excepções, claro: DeNiro (Touro Enraivecido), Day Lewis (O meu pé esquerdo), Di Caprio (What's eating Gilbert Grape?) e depois, quando há mulheres as máscaras são mais interiores. O nome que me vêm à cabeça é sempre Meryl Streep que se transmuta mas não se acredita que aquilo não lhe saia com quem bebe um copo de água. Ora o caso de Charlize Theron é impressionante por isso mesmo, ambíguo quanto baste para nos fazer confundir o exagero da personagem e a necessidade de credibilidade.
As suas curvas e pele cor de areia, lábios húmidos e olhos verdes inebriam, mas onde estão eles? Neste fime foram rapados, engordados, encardidos, mal tratados... em nome da transformação completa. Consegue-o? Sim, parece-me. A primeira vez que a vimos saltamos da cadeira. E saltamos porque antes ouvimos a voz dela, quente e sensual, mais engrossada e cínica. mas ainda assim suficientemente reconhecível. Depois o choque. É bom que não se chegue atrasado ao filme. Molhada, seca, para lá do desespero. Depois Theron perde-se, por vezes, em gestos e trejeitos mais rudes e pouco críveis que nos fazem desconfiar da necessidade dos mesmos e dizemos: oh, estava tudo a correr tão bem, não te faças aos prémios rapariga...
Se há um filme que a suporte e alivie tamanho peso, a resposta é que não há. E isso parece-me assumido. Não há filme para lá da personagem de Charlize Theron porque a ideia é ela ser o filme, a razão de ser, o fim e o princípio. Assim, faz sentido uma interpretação onde não há história? Faz sentido criar-se uma ficção quando se quer mostrar uma realidade? Qual o sentido de um filme - logo uma ficção - se nos quer remeter para a realidade. Ora, aqui é que a confusão se instala. Não é um filme redentor, que procure a compaixão ou entender as razões. E quando tenta a explicação, logo nos mostra a irracionalidade. A única pena que pode causar é o facto de desejarmos que ela seja apanhada para que não sofra mais. E isso não é sofremos por ela, é sofrermos com ela. E isso nem nos choca. Aillenn Wuornos não é uma mulher que possa estar à solta, à deriva... precisa ser controlada porque não tem nada, não lhe resta nada e ela não sabe estar sozinha, cuidar de si, ser adulta. E é aí que temos pena. Não por ela ter sido violada, espancada, ignorada, ter falta de amor. Mas por não ter força de sobreviver. E aí, nós podemos perceber que às vezes não basta encontrar forças onde elas não existem. Às vezes não se é capaz de mais.
É nessa altura, que coincide com o final do filme, que Aillen Wournos diz à amante Sellby (inexpressiva, mimada e inconsequente Christina Ricci) que tudo o que fez foi por amor e que assumirá todas as culpas. Que mesmo que ela não perceba porquê - porque nunca ninguém percebe a importância que pode ter para nós determinado olhar, só a presença, a palavra certa - o amor falará mais alto. E isto é feito sem consessões à piedade, ao sentimento... o olhar frio está lá, a certeza está lá, a razão está lá. A confusão instala-se. O que se deve sentir por uma muler assim? O que fazer a uma mulher assim?
Acabou o filme e eu saí da sala. Mais à noite apercebi-me que ainda carregava o peso dessas questões. Quase que sentia a sujidade do corpo dela no meu.
quarta-feira, fevereiro 25, 2004
O "xoxo" da amizade, update
Primeiro o Bruno contou da sua experiência, depois, esmiuçaram-se argumentos: aqui, aqui e aqui. Resumindo, agora que a primavera começa a despontar, sugiro, Bruno, que se abram os lábios e se deixe entrar o resto do corpo. A amizade também se entrega, assim, de lábios húmidos.
Primeiro o Bruno contou da sua experiência, depois, esmiuçaram-se argumentos: aqui, aqui e aqui. Resumindo, agora que a primavera começa a despontar, sugiro, Bruno, que se abram os lábios e se deixe entrar o resto do corpo. A amizade também se entrega, assim, de lábios húmidos.
terça-feira, fevereiro 24, 2004
segunda-feira, fevereiro 23, 2004
Equador no prato
Ainda sobre leituras no Equador, de MST, diz o Pedro: O desenlace de gema e clara é interessante, não há lamechices de pinto frustrado. Se não pode comer pão de mafra e fumeiro de barrancos e não gosta de bimbo ou panrico opte pelo meio termo - consuma o Equador. Palavra de ervilha. Segue...
Ainda sobre leituras no Equador, de MST, diz o Pedro: O desenlace de gema e clara é interessante, não há lamechices de pinto frustrado. Se não pode comer pão de mafra e fumeiro de barrancos e não gosta de bimbo ou panrico opte pelo meio termo - consuma o Equador. Palavra de ervilha. Segue...
sábado, fevereiro 21, 2004
Vou a tua casa
Ele entra pela porta comum e olha-nos como se fôssemos nós quem deveria dizer a primeira palavra. Os papéis estão invertidos. Avança pela casa, dispõe-se, constrange e vai às paredes ouvir a nossa voz... a que deveria dizer qualquer coisa; a que se silencia para o ouvir. Depois, invade um espaço que já não reconhecemos, revolve os objectos, devolve-os com a sua marca e pergunta se queremos o que queríamos dizer. Estamos mudos. Convida-nos para dançar, serve-se de uma bebida, mostra-nos fotografias, abre as janelas, rouba o ar da rua e oferece-nos algo nosso embrulhado em papel e fita. A surpresa deste gesto; o desembrulhar de algo que já era nosso imprime ao acto uma energia e inocência que encontram reflexo na forma como nos foi olhando ao longo do tempo. Depois vai-se embora, sem dizer palavra. Ficamos ali, na nossa casa, na nossa sala, com o nosso ar cheio da sua presença... os papéis colados na parede, as luzes acesas, o perfume nas dobras do sofá, nas linhas da mão, no nosso sorriso incrédulo. Quanto tempo fica em nós a marca de outra pessoa?
Rogério Nuno Costa desenvolveu o espectáculo Vou a tua casa, porque queria conhecer Lisboa; queria proteger-se da cidade que o acolhia. Entrou em casas e apartamentos, vivendas, quartos e mansões. Foi-se espalhando pela cidade à procura da forma das palavras amo-te, eu, tu... Somos nós quem o convidamos, como quem convida um amigo a jantar, à hora que quisermos, no dia que mais nos apetecer, com mais pessoas ou só com íntimos. E o Rogério chega, de saco às costas e leitor de cd’s na mão, apresenta-se, quer nos dizer para sermos naturais, continuarmos com o que estávamos a fazer, infringir todas as regras que se têm que cumprir numa peça de teatro. Aqui, em nossa casa, não é preciso fingir. Não se finge para os amigos. Como alguém que já pertenceu ao nosso espaço, ele procura a sua própria memória e nós envergonhamo-nos de termos deitado fora as suas marcas, como se faz quando nos despedimos para sempre de alguém. Mas ele voltou. Voltou para ver como estávamos, se tínhamos sentido a sua falta, para mostrar que está bem, vivo, feliz... e que nos leva com ele de casa em casa.
Se fosse só teatro, o Rogério ficava para os aplausos, fazia descer a cortina, limpava a maquilhagem, arrumava os adereços e voltava no dia seguinte. Mas Vou a tua casa não é só teatro... é um pedacinho de verdade, de entrega, de paixão, de procura, de memória... de amor. É a forma como olhamos para as nossas coisas e nos recordamos do exacto momento em que lhes pegámos pela primeira vez. É, em suma, um presente para ser descoberto e que antes de ser rasgado pode conter lá dentro o mundo. Ele não fica para os agradecimentos... entrega-nos ao espanto e à surpresa desarmante. Desarmados.
Todos os espectáculos são diferentes porque cada casa é uma relação, uma memória, uma vida. E nós acreditamos que ele faz aquilo só para nós, como quando achamos que só nos dizem amo-te a nós. É por isso que quando o Rogério escreve amo-te nas folhas presas na parede, nós nos emocionamos, porque aquelas letras têm a forma e o som da mais bela voz a dizer-nos é só para ti.
Felizmente, o Rogério não terminou, como tinha planeado, o espectáculo no início do ano chinês. Estende-se até 12 de Março, a qualquer hora e dia, para terminar numa sessão especial no novo espaço do CEM, onde, acreditamos, o coração dele explodirá e de lá sairão todos os nomes, os rostos, os sorrisos de quem ele visitou. Aí, confrontados com a mesma história, poderemos sentir-nos tranquilos. Não fomos sozinhos na escolha. Estamos, também, ao nosso lado. E ele a ver. Porque, quem escolhe também é escolhido.
Informações
Marcação prévia: 91 640 99 98 ou rogerionunocosta@sapo.pt
PREÇO
10€.
Aqui também pode ler sobre este espectáculo. Aqui, sobre o anterior que vi do Rogério.
Ele entra pela porta comum e olha-nos como se fôssemos nós quem deveria dizer a primeira palavra. Os papéis estão invertidos. Avança pela casa, dispõe-se, constrange e vai às paredes ouvir a nossa voz... a que deveria dizer qualquer coisa; a que se silencia para o ouvir. Depois, invade um espaço que já não reconhecemos, revolve os objectos, devolve-os com a sua marca e pergunta se queremos o que queríamos dizer. Estamos mudos. Convida-nos para dançar, serve-se de uma bebida, mostra-nos fotografias, abre as janelas, rouba o ar da rua e oferece-nos algo nosso embrulhado em papel e fita. A surpresa deste gesto; o desembrulhar de algo que já era nosso imprime ao acto uma energia e inocência que encontram reflexo na forma como nos foi olhando ao longo do tempo. Depois vai-se embora, sem dizer palavra. Ficamos ali, na nossa casa, na nossa sala, com o nosso ar cheio da sua presença... os papéis colados na parede, as luzes acesas, o perfume nas dobras do sofá, nas linhas da mão, no nosso sorriso incrédulo. Quanto tempo fica em nós a marca de outra pessoa?
Rogério Nuno Costa desenvolveu o espectáculo Vou a tua casa, porque queria conhecer Lisboa; queria proteger-se da cidade que o acolhia. Entrou em casas e apartamentos, vivendas, quartos e mansões. Foi-se espalhando pela cidade à procura da forma das palavras amo-te, eu, tu... Somos nós quem o convidamos, como quem convida um amigo a jantar, à hora que quisermos, no dia que mais nos apetecer, com mais pessoas ou só com íntimos. E o Rogério chega, de saco às costas e leitor de cd’s na mão, apresenta-se, quer nos dizer para sermos naturais, continuarmos com o que estávamos a fazer, infringir todas as regras que se têm que cumprir numa peça de teatro. Aqui, em nossa casa, não é preciso fingir. Não se finge para os amigos. Como alguém que já pertenceu ao nosso espaço, ele procura a sua própria memória e nós envergonhamo-nos de termos deitado fora as suas marcas, como se faz quando nos despedimos para sempre de alguém. Mas ele voltou. Voltou para ver como estávamos, se tínhamos sentido a sua falta, para mostrar que está bem, vivo, feliz... e que nos leva com ele de casa em casa.
Se fosse só teatro, o Rogério ficava para os aplausos, fazia descer a cortina, limpava a maquilhagem, arrumava os adereços e voltava no dia seguinte. Mas Vou a tua casa não é só teatro... é um pedacinho de verdade, de entrega, de paixão, de procura, de memória... de amor. É a forma como olhamos para as nossas coisas e nos recordamos do exacto momento em que lhes pegámos pela primeira vez. É, em suma, um presente para ser descoberto e que antes de ser rasgado pode conter lá dentro o mundo. Ele não fica para os agradecimentos... entrega-nos ao espanto e à surpresa desarmante. Desarmados.
Todos os espectáculos são diferentes porque cada casa é uma relação, uma memória, uma vida. E nós acreditamos que ele faz aquilo só para nós, como quando achamos que só nos dizem amo-te a nós. É por isso que quando o Rogério escreve amo-te nas folhas presas na parede, nós nos emocionamos, porque aquelas letras têm a forma e o som da mais bela voz a dizer-nos é só para ti.
Felizmente, o Rogério não terminou, como tinha planeado, o espectáculo no início do ano chinês. Estende-se até 12 de Março, a qualquer hora e dia, para terminar numa sessão especial no novo espaço do CEM, onde, acreditamos, o coração dele explodirá e de lá sairão todos os nomes, os rostos, os sorrisos de quem ele visitou. Aí, confrontados com a mesma história, poderemos sentir-nos tranquilos. Não fomos sozinhos na escolha. Estamos, também, ao nosso lado. E ele a ver. Porque, quem escolhe também é escolhido.
Informações
Marcação prévia: 91 640 99 98 ou rogerionunocosta@sapo.pt
PREÇO
10€.
Aqui também pode ler sobre este espectáculo. Aqui, sobre o anterior que vi do Rogério.
Imagens e Comentários
Estou feliz. Este blog passa a ter imagens e regressam os comentários.. Devo-o ao Pedro, que pacientemente me foi explicando como se fazia.
Estou feliz. Este blog passa a ter imagens e regressam os comentários.. Devo-o ao Pedro, que pacientemente me foi explicando como se fazia.
sexta-feira, fevereiro 20, 2004
Rapariga com brinco de pérola
Eu sei que se tocasse
com a mão aquele canto do quadro
onde um amarelo arde
me queimaria nele
ou teria manchado para sempre de delírio
a ponta dos dedos.
Pintura (Ferreira Gullar)
Há uma certa luz que nos invade, no espaço que nós invadimos. Uma luz que tem música, cheiro, sabor, sentido, forma... Há uma luz imensa que nos enche e que reconhecemos como quando nos vemos no espelho; uma luz distante e, ao mesmo tempo, que nos esmaga, como se nos obrigasse a respirar menos, para ocuparmos menos espaço; uma luz cheia; uma luz viva. Há uma luz que é tudo, tão silenciosa quanto discreta. Uma luz que sempre esteve lá, mas que nós já não vamos ver. Uma luz divina.
Falo da luz de Rapariga com brinco de pérola porque é dela que nos recordamos quando saímos do filme e é nela que reparamos desde o primeiro momento. Na verdade, quase que poderíamos arriscar afirmar que o filme de Peter Webber pouco mais faz que nos ofertar um pouco dessa luz e tanto assim é que o filme parece fundir-se na escuridão do excesso do peso que a luz encerra. Figurinos, adereços, paisagens, personagens, música... tudo é levado ao extremo de dela partir e a ela regressar. Pouco mais sobra deste filme. Não há personagens reprimidos, há personagens esmagados contra o peso de uma intenção – as personagens são esboços já de si distantes, pois tratam-se de especulações. Não há figurinos, há tons mais ou menos destacados e organizados, tal como os adereços, numa escala gradativa de tonalidades representativas e facilmente identificáveis – a escuridão da cave, a penumbra quente da cozinha, o pastel do tédio dos quartos e o excesso do estúdio, mais perto do céu, mais perto de Deus.
A biografia ficcionada do quadro de Vermeer deixa de existir para nos mostrarem um tratado da bela iluminação para cinema a fazer as vezes de um naturalismo exacerbado e até oco. A anedota em que se transforma o filme, passado o encanto de vermos a luz a carregá-lo às costas, contraria a intenção do próprio Vermeer que, no entender dos especialistas, renunciou às naturezas – mortas compostas e deu-lhes a vida cristalizando momentos. Daí tudo nos parecer passível de ser um quadro. Daí a originalidade de Vermeer voltar a ser anedota nas mãos de quem mais não viu que a luz. A luz pode ser muita coisa, mas não é, com certeza, tudo. E não é, sobretudo, a desinspiração, o enfado, a estética pela estética...
O problema maior do filme de Peter Webber é ter acreditado que bastaria recriar cenograficamente o ambiente – só lá falta o cheiro – para nos fazer entrar dentro do universo da Holanda do século XVII. Como exemplo de como a pintura pode servir o cinema, cite-se “A Inglesa e o Duque” de Eric Rohmer, que faz dos quadros cenários e das personagens objectos pintados. Mas esses existem, aqui não. Aqui, cada gesto é um possível quadro; cada frase um gesto. De um gesto ao outro vai a distância de uma pincelada de Vermeer. Tenho, para mim, que Vermeer seria mais acutilante que a representação que dele fazem neste filme. Basta olhar para o rasgar de olhar que a sua pintura oferece sobre o quotidiano; como de repente, estamos lá dentro, somos nós, estivemos ali, estamos ali. Neste filme, a escancarada porta assusta-nos porque ameaça prender-nos. Nos quadros de Vermeer nós sabemos que há uma acção, um movimento, uma intenção. Aqui, resume-se tudo à contemplação. E o olhar, esse, perdeu-se há muito para outros sentidos.
Rapariga com brinco de pérola é, em suma, um fraco filme com potencialidades não exploradas. Há um momento em que Griet (Scarlett Johansson) pergunta à mulher de Vermeer se deve abrir as janelas, pois, se o fizer, a luz do estúdio será alterada. A resposta positiva da mulher do pintor é o mesmo sinal negativo que o realizador nos dá. A invasão do espaço sagrado da concepção foi violenta, abrupta e disruptiva. De facto, a luz será alterada, os quadros não serão mais os mesmos, as representações serão mais expostas. E era na penumbra do conhecimento que gostaríamos de ter ficado. Não percebeu que gostaríamos de ter percebido mais, de ter amado mais, de ter gostado mais. Gostaríamos de ter percebido, amado e gostado mais sim se, a entrada nos quadros não tivesse sido pelo aspecto mais gratuito, fácil e óbvio: a necessidade, aqui, não aguça o engenho. Antes o trava. E a descoberta dos pormenores nos quadros de Vermeer faz-se numa escalada de luz, também ela, ganha com sacrifício e atenção. Quanto mais olharmos mais vemos. Aqui, quanto mais olhamos, menos vezes abrimos os olhos, porque a vontade, o sonho e o desejo é mergulhar, sem mãos, ajuda ou apoio nos quadros mortos que carregam vivos.
No final do filme, Griet regressa ao ponto de partida depois de ter visto a luz. Nós, nunca saímos do mesmo sítio. A luz não se explica, sente-se.
Eu sei que se tocasse
com a mão aquele canto do quadro
onde um amarelo arde
me queimaria nele
ou teria manchado para sempre de delírio
a ponta dos dedos.
Pintura (Ferreira Gullar)
Há uma certa luz que nos invade, no espaço que nós invadimos. Uma luz que tem música, cheiro, sabor, sentido, forma... Há uma luz imensa que nos enche e que reconhecemos como quando nos vemos no espelho; uma luz distante e, ao mesmo tempo, que nos esmaga, como se nos obrigasse a respirar menos, para ocuparmos menos espaço; uma luz cheia; uma luz viva. Há uma luz que é tudo, tão silenciosa quanto discreta. Uma luz que sempre esteve lá, mas que nós já não vamos ver. Uma luz divina.
Falo da luz de Rapariga com brinco de pérola porque é dela que nos recordamos quando saímos do filme e é nela que reparamos desde o primeiro momento. Na verdade, quase que poderíamos arriscar afirmar que o filme de Peter Webber pouco mais faz que nos ofertar um pouco dessa luz e tanto assim é que o filme parece fundir-se na escuridão do excesso do peso que a luz encerra. Figurinos, adereços, paisagens, personagens, música... tudo é levado ao extremo de dela partir e a ela regressar. Pouco mais sobra deste filme. Não há personagens reprimidos, há personagens esmagados contra o peso de uma intenção – as personagens são esboços já de si distantes, pois tratam-se de especulações. Não há figurinos, há tons mais ou menos destacados e organizados, tal como os adereços, numa escala gradativa de tonalidades representativas e facilmente identificáveis – a escuridão da cave, a penumbra quente da cozinha, o pastel do tédio dos quartos e o excesso do estúdio, mais perto do céu, mais perto de Deus.
A biografia ficcionada do quadro de Vermeer deixa de existir para nos mostrarem um tratado da bela iluminação para cinema a fazer as vezes de um naturalismo exacerbado e até oco. A anedota em que se transforma o filme, passado o encanto de vermos a luz a carregá-lo às costas, contraria a intenção do próprio Vermeer que, no entender dos especialistas, renunciou às naturezas – mortas compostas e deu-lhes a vida cristalizando momentos. Daí tudo nos parecer passível de ser um quadro. Daí a originalidade de Vermeer voltar a ser anedota nas mãos de quem mais não viu que a luz. A luz pode ser muita coisa, mas não é, com certeza, tudo. E não é, sobretudo, a desinspiração, o enfado, a estética pela estética...
O problema maior do filme de Peter Webber é ter acreditado que bastaria recriar cenograficamente o ambiente – só lá falta o cheiro – para nos fazer entrar dentro do universo da Holanda do século XVII. Como exemplo de como a pintura pode servir o cinema, cite-se “A Inglesa e o Duque” de Eric Rohmer, que faz dos quadros cenários e das personagens objectos pintados. Mas esses existem, aqui não. Aqui, cada gesto é um possível quadro; cada frase um gesto. De um gesto ao outro vai a distância de uma pincelada de Vermeer. Tenho, para mim, que Vermeer seria mais acutilante que a representação que dele fazem neste filme. Basta olhar para o rasgar de olhar que a sua pintura oferece sobre o quotidiano; como de repente, estamos lá dentro, somos nós, estivemos ali, estamos ali. Neste filme, a escancarada porta assusta-nos porque ameaça prender-nos. Nos quadros de Vermeer nós sabemos que há uma acção, um movimento, uma intenção. Aqui, resume-se tudo à contemplação. E o olhar, esse, perdeu-se há muito para outros sentidos.
Rapariga com brinco de pérola é, em suma, um fraco filme com potencialidades não exploradas. Há um momento em que Griet (Scarlett Johansson) pergunta à mulher de Vermeer se deve abrir as janelas, pois, se o fizer, a luz do estúdio será alterada. A resposta positiva da mulher do pintor é o mesmo sinal negativo que o realizador nos dá. A invasão do espaço sagrado da concepção foi violenta, abrupta e disruptiva. De facto, a luz será alterada, os quadros não serão mais os mesmos, as representações serão mais expostas. E era na penumbra do conhecimento que gostaríamos de ter ficado. Não percebeu que gostaríamos de ter percebido mais, de ter amado mais, de ter gostado mais. Gostaríamos de ter percebido, amado e gostado mais sim se, a entrada nos quadros não tivesse sido pelo aspecto mais gratuito, fácil e óbvio: a necessidade, aqui, não aguça o engenho. Antes o trava. E a descoberta dos pormenores nos quadros de Vermeer faz-se numa escalada de luz, também ela, ganha com sacrifício e atenção. Quanto mais olharmos mais vemos. Aqui, quanto mais olhamos, menos vezes abrimos os olhos, porque a vontade, o sonho e o desejo é mergulhar, sem mãos, ajuda ou apoio nos quadros mortos que carregam vivos.
No final do filme, Griet regressa ao ponto de partida depois de ter visto a luz. Nós, nunca saímos do mesmo sítio. A luz não se explica, sente-se.
Publicidade paga (ou em causa própria)
WORKSHOP de PRODUÇÃO DE ESPECTÁCULOS
O PAPEL DO PRODUTOR NO PROCESSO DE CRIAÇÃO
com Tiago Bartolomeu Costa
Local: Delegação Regional Instituto Português da Juventude
Via Moscavide lote 47 101, Lisboa (Parque das Nações)
N.º de horas: 22
Datas: 09 a 27 Março
Horários: terças e quintas: 19h – 21h (sábado 27: 15-19h)
Preço: 60 €
Informações: 96 550 9 550
tiagobartolomeucosta@hotmail.com
WORKSHOP de PRODUÇÃO DE ESPECTÁCULOS
O PAPEL DO PRODUTOR NO PROCESSO DE CRIAÇÃO
com Tiago Bartolomeu Costa
Local: Delegação Regional Instituto Português da Juventude
Via Moscavide lote 47 101, Lisboa (Parque das Nações)
N.º de horas: 22
Datas: 09 a 27 Março
Horários: terças e quintas: 19h – 21h (sábado 27: 15-19h)
Preço: 60 €
Informações: 96 550 9 550
tiagobartolomeucosta@hotmail.com
Blog para que te escrevo
O Luís Ene abriu um concurso de literatura para blogs. Os caminhos vão deixando de ser cada vez menos virtuais. E que bom...
O Luís Ene abriu um concurso de literatura para blogs. Os caminhos vão deixando de ser cada vez menos virtuais. E que bom...
O fim... ou o princípio de outras eras
O Pedro Lomba, da Flor da Obsessão, foi a primeira pessoa a enviar um e-mail para este blog. Depois ouvi-o dizer no EIB que escrevia no blog porque precisava... agora vai acabar com a sua flor. Decepa-a no final da semana. Este fim de semana. Para que possa ser plagiado, copiem-se os posts elucidativos que escreveu ao longo dos tempos. Adeus Pedro.
O Pedro Lomba, da Flor da Obsessão, foi a primeira pessoa a enviar um e-mail para este blog. Depois ouvi-o dizer no EIB que escrevia no blog porque precisava... agora vai acabar com a sua flor. Decepa-a no final da semana. Este fim de semana. Para que possa ser plagiado, copiem-se os posts elucidativos que escreveu ao longo dos tempos. Adeus Pedro.
A voz dos deuses
Durão Barroso falou à hora dos telejornais do almoço (correndo o risco de fazer engasgar os comensais) acerca do cumprimento das normas europeias. Que caminhávamos no sentido certo, considerados e orgulhosos. Eu só me consegui lembrar das faltas de respeito francesas e alemãs, das medidas extraordinárias, das dificuldades acrescidas...
Em notas de rodapé, os telejornais falavam da subida dos níveis de desemprego, das listas de espera nos hospitais, da violência nos estádios... Caminhamos, de facto mas para onde?
Durão Barroso falou à hora dos telejornais do almoço (correndo o risco de fazer engasgar os comensais) acerca do cumprimento das normas europeias. Que caminhávamos no sentido certo, considerados e orgulhosos. Eu só me consegui lembrar das faltas de respeito francesas e alemãs, das medidas extraordinárias, das dificuldades acrescidas...
Em notas de rodapé, os telejornais falavam da subida dos níveis de desemprego, das listas de espera nos hospitais, da violência nos estádios... Caminhamos, de facto mas para onde?
A explicação
Vem tudo explicado no Inimigo Público, da responsabilidade destes:
SANTANA PADECE DE AMBIÇÃO MÓRBIDA:
"Caracterizada por um apetite desmesurado do próprio ego por cargos públicos. a Ambição Mórbida tem em Santanma Lopes o rosto mais visível desta enfermidade. No intuito de satisfazer o seu apetite por lugares de proeminência, o paciente vai acumulando todas as funções que a vida pública lhe pode oferecer: câmaras municipais, clubes de futebol, preseidencias da República, master of the universe, etc. Os sintomas exteriores da doença manifestam-se através de entrevistas televisivas, artigos de opinião, lançamentos de livros e cartazes auto-promocionais. A Direcção Nacional do PSD tem um dinheirinho posto de parte para a operação e aguarda apenas a chegada a Portugal de uma marquesa que aguente o peso do ego de Santana. Uma marquesa de hospital, bem entendido."
Vem tudo explicado no Inimigo Público, da responsabilidade destes:
SANTANA PADECE DE AMBIÇÃO MÓRBIDA:
"Caracterizada por um apetite desmesurado do próprio ego por cargos públicos. a Ambição Mórbida tem em Santanma Lopes o rosto mais visível desta enfermidade. No intuito de satisfazer o seu apetite por lugares de proeminência, o paciente vai acumulando todas as funções que a vida pública lhe pode oferecer: câmaras municipais, clubes de futebol, preseidencias da República, master of the universe, etc. Os sintomas exteriores da doença manifestam-se através de entrevistas televisivas, artigos de opinião, lançamentos de livros e cartazes auto-promocionais. A Direcção Nacional do PSD tem um dinheirinho posto de parte para a operação e aguarda apenas a chegada a Portugal de uma marquesa que aguente o peso do ego de Santana. Uma marquesa de hospital, bem entendido."
Leitor profissional
Não sou um leitor profissional. Leio sempre e muito. Mas não leio tudo. Não leio, sobretudo, depressa, com voracidade consumista e impeço-me de comprar livros porque já sei que quanto mais tempo ficarem na prateleira menos vontade tenho de lhes pegar. As minhas prateleiras enchem-se de livros desvirginados uma vez. Depois, quando os abro novamente, reconheço-lhes o tempo em que me acompanharam. E depois tenho fases, umas mais produtivas que outras... leio vorazmente ou começo muitos... as fases alternam, como devem ser todas as fases. E agora, a acrescentar à lista de coisas para ler (Proust, o 3º volume da Agustina, Mário de Carvalho, o resto da Duras) a Assírio reeditou a trilogia sobre o Alexandre, o Grande da autoria da Mary Renault. Em boa hora o fez, mas ainda não é a minha. Para já tenho parada a Baía dos Tigres, de Pedro Rosa Mendes e comecei a ler Mefisto de Klaus Mann.
Não sou um leitor profissional. Leio sempre e muito. Mas não leio tudo. Não leio, sobretudo, depressa, com voracidade consumista e impeço-me de comprar livros porque já sei que quanto mais tempo ficarem na prateleira menos vontade tenho de lhes pegar. As minhas prateleiras enchem-se de livros desvirginados uma vez. Depois, quando os abro novamente, reconheço-lhes o tempo em que me acompanharam. E depois tenho fases, umas mais produtivas que outras... leio vorazmente ou começo muitos... as fases alternam, como devem ser todas as fases. E agora, a acrescentar à lista de coisas para ler (Proust, o 3º volume da Agustina, Mário de Carvalho, o resto da Duras) a Assírio reeditou a trilogia sobre o Alexandre, o Grande da autoria da Mary Renault. Em boa hora o fez, mas ainda não é a minha. Para já tenho parada a Baía dos Tigres, de Pedro Rosa Mendes e comecei a ler Mefisto de Klaus Mann.
Dia dos namorados... ultimate experience
Seria um dia normal se os sentidos não estivessem mais apurados, as sensibilidades mais expostas, as intenções menos veladas, as armadilhas menos expostas. Falhar em dia de namorados é abrir uma ferida para as próximas semanas, só fechada com a celebração da data de namoro, que se espera ocorra em breve. Os constrangimentos também surgem se quisermos ligar a alguém... será que vai pensar que?... E se convidarmos alguém a ir sair, ver um filme, beber um café será que vai achar que quieremos algo mais? Que vemos nós nos que estão à nossa volta em dia de namorados, serão todos casais?
Seria um dia normal se os sentidos não estivessem mais apurados, as sensibilidades mais expostas, as intenções menos veladas, as armadilhas menos expostas. Falhar em dia de namorados é abrir uma ferida para as próximas semanas, só fechada com a celebração da data de namoro, que se espera ocorra em breve. Os constrangimentos também surgem se quisermos ligar a alguém... será que vai pensar que?... E se convidarmos alguém a ir sair, ver um filme, beber um café será que vai achar que quieremos algo mais? Que vemos nós nos que estão à nossa volta em dia de namorados, serão todos casais?
quinta-feira, fevereiro 19, 2004
Equador, capítulo final
Nestes dias silenciosos, dei por terminada a leitura do Equador, do Miguel Sousa Tavares. Não fiquei impressionado nem desiludido. O natural interesse em conhecer São Tomé e Príncipe aguarda natural substituição e não me vai ficar na memória outra coisa que não seja o real conhecimento de que MST se documentou. O que é pena, pois se não se tivesse deixado levar tanto pela autenticidade e talvez tivesse melhor história. O que me enfadou no livro foi perceber que MST deu excessiva importância ao facto histórico e por vezes falha a relação directa com o que quer contar. O pano de fundo das roças são tomenses não permite o desenvolvimento do protagonista e a história não passa disso mesmo, um pano de fundo a fazer as vezes de história principal. Impressionou-me, também, a falta de originalidade das descrições sexuais... a dada altura pareceu-me que a MST tinham faltado os termos.
Com Equador (que não deixou, no entanto, de ser devorado nas páginas finais) fica o travo amargo de algo que poderia ser maravilhoso, que não acusasse tanto a intenção de ser qualquer coisa inovadora a armar ao inclassificável, ao conhecedor, ao despretensioso, ao sem-outro-objectivo-que-não-fosse-o-prazer. No entanto, Equador, é bastante melhor que o conjunto dos livros editados pela Editorial Notícias e ditos light. Para quem quiser conhecer, a um nível superficial q.b. o que foi e o que era, pois que o leia. Vai ver que custa menos do que pesa. Mas MST é melhor cronista que romancista.
Com Equador, aconteceu-me uma coisa que nunca tinha acontecido com outro livro: certo dia, no metro, esbarrei com uma senhora que também o lia. Deve ser a isso que se chama best-seller.
Nestes dias silenciosos, dei por terminada a leitura do Equador, do Miguel Sousa Tavares. Não fiquei impressionado nem desiludido. O natural interesse em conhecer São Tomé e Príncipe aguarda natural substituição e não me vai ficar na memória outra coisa que não seja o real conhecimento de que MST se documentou. O que é pena, pois se não se tivesse deixado levar tanto pela autenticidade e talvez tivesse melhor história. O que me enfadou no livro foi perceber que MST deu excessiva importância ao facto histórico e por vezes falha a relação directa com o que quer contar. O pano de fundo das roças são tomenses não permite o desenvolvimento do protagonista e a história não passa disso mesmo, um pano de fundo a fazer as vezes de história principal. Impressionou-me, também, a falta de originalidade das descrições sexuais... a dada altura pareceu-me que a MST tinham faltado os termos.
Com Equador (que não deixou, no entanto, de ser devorado nas páginas finais) fica o travo amargo de algo que poderia ser maravilhoso, que não acusasse tanto a intenção de ser qualquer coisa inovadora a armar ao inclassificável, ao conhecedor, ao despretensioso, ao sem-outro-objectivo-que-não-fosse-o-prazer. No entanto, Equador, é bastante melhor que o conjunto dos livros editados pela Editorial Notícias e ditos light. Para quem quiser conhecer, a um nível superficial q.b. o que foi e o que era, pois que o leia. Vai ver que custa menos do que pesa. Mas MST é melhor cronista que romancista.
Com Equador, aconteceu-me uma coisa que nunca tinha acontecido com outro livro: certo dia, no metro, esbarrei com uma senhora que também o lia. Deve ser a isso que se chama best-seller.
Comentários
Ainda não se pode comentar neste blog, sabe-se lá porquê. As ajudas fizeram-se notar, mas nem assim... as minhas desculpas.
Ainda não se pode comentar neste blog, sabe-se lá porquê. As ajudas fizeram-se notar, mas nem assim... as minhas desculpas.
Nas palhinhas deitado, nas palhinhas estendido
Eu não sou fã de futebol. Não sou. Enfado-me com os jogos, os relatos, as tricas, as crises, as entrevistas, os protagonismos, o vazio, o resto... e por isso escuso-me a opinar sobre o tema. De vez em quando aperçebo-me de qualquer coisa e até já assisti a alguns jogos da selecção. E de cada vez que o faço ouço sempre que o Figo é o melhor. Mas sempre que vejo, ouço dizer ou leio nos jornais que Figo, o nosso melhor jogador, se poupou ao esforço, fez um belo jogo mas não marcou golo, brilhou numa noite inglória, falhou as oportunidades de vitória mas teve à altura do seu carácter, permitiu que os outros colegas também brilhassem, fez do futebol um bom espectáculo, projectou fora de fronteiras o nome de Portugal... bla, bla, bla... Mas jogar que é bom, nada.
Do pouco que me apercebo, o Figo está-se sempre a poupar, ou é poupado, ou nem sequer se nota. Pauleta marcou 3 golos à Polónia, no Mundial, mas foi de Figo que se falou, o mesmo que tinha falhado tantas oportunidades no jogo contra os Estados Unidos, meu deus que jogam futebol há 3 dias... Neste jogo contra a Inglaterra, foi de novo Pauleta a marcar, mas a noite era de Figo e da sua 100ª internacionalização? E depois, que interessa isso? Teve medo dos conflitos no balneário quando chegasse ao Real Madrid e se tivesse que ver com o Beckham?
Oh senhor jogue. Mas joge mesmo.
Eu não sou fã de futebol. Não sou. Enfado-me com os jogos, os relatos, as tricas, as crises, as entrevistas, os protagonismos, o vazio, o resto... e por isso escuso-me a opinar sobre o tema. De vez em quando aperçebo-me de qualquer coisa e até já assisti a alguns jogos da selecção. E de cada vez que o faço ouço sempre que o Figo é o melhor. Mas sempre que vejo, ouço dizer ou leio nos jornais que Figo, o nosso melhor jogador, se poupou ao esforço, fez um belo jogo mas não marcou golo, brilhou numa noite inglória, falhou as oportunidades de vitória mas teve à altura do seu carácter, permitiu que os outros colegas também brilhassem, fez do futebol um bom espectáculo, projectou fora de fronteiras o nome de Portugal... bla, bla, bla... Mas jogar que é bom, nada.
Do pouco que me apercebo, o Figo está-se sempre a poupar, ou é poupado, ou nem sequer se nota. Pauleta marcou 3 golos à Polónia, no Mundial, mas foi de Figo que se falou, o mesmo que tinha falhado tantas oportunidades no jogo contra os Estados Unidos, meu deus que jogam futebol há 3 dias... Neste jogo contra a Inglaterra, foi de novo Pauleta a marcar, mas a noite era de Figo e da sua 100ª internacionalização? E depois, que interessa isso? Teve medo dos conflitos no balneário quando chegasse ao Real Madrid e se tivesse que ver com o Beckham?
Oh senhor jogue. Mas joge mesmo.
Pão e circo
JPP escalerece-o hoje, pela enésima vez: o país está a saque. A saque do futebol e das aventuras do pequeno polítíco sem noção de que é uma figura meteórica. Para onde quer que nos viremos, excursões dos fãs futebolísticos e do outro os comentários a mais uma frase de Santana Lopes. Onde está o resto do país? Que reponsabilidades têm os outros, escondidos na sombra destes que tudo mostram, tudo expõem, tudo ocupam?
Vamos imaginar que o Euro corre bem e que Santana é mesmo candidato. De que se vai falar depois? Para onde correrá Santana? É que ele tem o quê... 40 anos? Seja, de 2006 a 2016 (porque cá no burgo dão-se sempre segundos mandatos), são 10 anos e depois, Dr. Santana? é muito novo para se reformar? A que ambiciona? Presidente da Comissão Europeia (é que lá fora ninguém sabe quem é) E aguenta-se 10 anos à bronca do protocolo, da palavra comedida, da vénia, concordância, respeito e serenidade?
Como fica Lisboa entretanto?
JPP escalerece-o hoje, pela enésima vez: o país está a saque. A saque do futebol e das aventuras do pequeno polítíco sem noção de que é uma figura meteórica. Para onde quer que nos viremos, excursões dos fãs futebolísticos e do outro os comentários a mais uma frase de Santana Lopes. Onde está o resto do país? Que reponsabilidades têm os outros, escondidos na sombra destes que tudo mostram, tudo expõem, tudo ocupam?
Vamos imaginar que o Euro corre bem e que Santana é mesmo candidato. De que se vai falar depois? Para onde correrá Santana? É que ele tem o quê... 40 anos? Seja, de 2006 a 2016 (porque cá no burgo dão-se sempre segundos mandatos), são 10 anos e depois, Dr. Santana? é muito novo para se reformar? A que ambiciona? Presidente da Comissão Europeia (é que lá fora ninguém sabe quem é) E aguenta-se 10 anos à bronca do protocolo, da palavra comedida, da vénia, concordância, respeito e serenidade?
Como fica Lisboa entretanto?
A mão que embala o berço
É verdade que nos comovemos e até sentimos uma ponta de orgulho quando a história do pequeno (qualquer coisa) correu a favor do Refúgio Aboim Ascensão e do seu responsável Luís Villas-Boas. Acreditámos - e mais ainda com os acontecimentos que viriam a por em causa as responsabilidades e deveres dos que têm a guarda de menores indefesos - que Villas-Boas era alguém íntegro, respeitador, consciente e informado. Alguém que saberia o que é melhor para uma criança, mesmo que isso implicasse não a entregar aos pais. Nessa altura, ele foi elogiado, agraciado, comovidamente considerado. E agora estragou tudo...
O que Luís Villas-Boas disse do caso das lésbicas espanholas, é tanto mais indecente se tivermos em conta o seu passado; as acções do seu passado. A criança ficará melhor se entregue a outros familiares que não à companheira da mãe que cuidou que acompanhou a sua educação? E baseando-se em perigo de má formação moral, desvio comportamental, opção sexual... Não se deveria falar antes dos valores e daquilo que são os laços entre pais e filhos? Pai é quem educa não é só quem faz nascer. Ser lésbica não é ser mulher na plenitude natural do termo, porque se assim fosse não haveria o problema da procriação natural, continua Villas-Boas. Eu fico espantado com a veleidade destas aformações, sobretudo considerando o frenesim especulatório, homofóbico, doentio e perverso que este tipo de afirmações pode provocar em pessoas menos abertos à discussão, conhecimento, aprendizagem e integração. É, sobretudo, triste e vexatório. Mas no melhor pano cai a nódoa. Temo o pior com as discussões futuras...
É verdade que nos comovemos e até sentimos uma ponta de orgulho quando a história do pequeno (qualquer coisa) correu a favor do Refúgio Aboim Ascensão e do seu responsável Luís Villas-Boas. Acreditámos - e mais ainda com os acontecimentos que viriam a por em causa as responsabilidades e deveres dos que têm a guarda de menores indefesos - que Villas-Boas era alguém íntegro, respeitador, consciente e informado. Alguém que saberia o que é melhor para uma criança, mesmo que isso implicasse não a entregar aos pais. Nessa altura, ele foi elogiado, agraciado, comovidamente considerado. E agora estragou tudo...
O que Luís Villas-Boas disse do caso das lésbicas espanholas, é tanto mais indecente se tivermos em conta o seu passado; as acções do seu passado. A criança ficará melhor se entregue a outros familiares que não à companheira da mãe que cuidou que acompanhou a sua educação? E baseando-se em perigo de má formação moral, desvio comportamental, opção sexual... Não se deveria falar antes dos valores e daquilo que são os laços entre pais e filhos? Pai é quem educa não é só quem faz nascer. Ser lésbica não é ser mulher na plenitude natural do termo, porque se assim fosse não haveria o problema da procriação natural, continua Villas-Boas. Eu fico espantado com a veleidade destas aformações, sobretudo considerando o frenesim especulatório, homofóbico, doentio e perverso que este tipo de afirmações pode provocar em pessoas menos abertos à discussão, conhecimento, aprendizagem e integração. É, sobretudo, triste e vexatório. Mas no melhor pano cai a nódoa. Temo o pior com as discussões futuras...
sexta-feira, fevereiro 13, 2004
terça-feira, fevereiro 10, 2004
A ESPERANÇA
Em relação aos dados dos estudos apresentados pela revista Telenovelas, referenciados pelo Tiago num post mais abaixo, impõe-se-me algumas considerações - causadas, é claro, pela surpresa.
20% de pessoas conquistaram alguém desconhecido? Independentemente de eu não perceber como é que se excluem desses os 4% que se encontraram de modo acidental, acho esse número estrondoso. Muitas vezes me indaguei - normalmente acontece quando uma pessoa está disponível e todas as pessoas à volta parecem desinteressantes - como é que as pessoas conhecem a sua cara metade fora daquele círculo já bem conhecido e "pesquisado". Pois bem, a minha resposta estava nos 37% e nos 32% referidos.
Agora - COMO? - 20% conquistam um desconhecido! 20%!
Afinal, há esperança. Não temos de esperar por uma festa em casa de amigos, não temos de ansiar por um encontro fortuito nas escadas do sítio em que estamos a trabalhar ou por um trabalho em comum, basta-nos oferecer flores como se fosse impulse.
Para todos os encalhados, uma palavra de esperança então: olhem bem para os desconhecidos. A vossa cara metade pode estar lá. E se frequentam transportes públicos, repartições públicas, centros comerciais, atenção redobrada.
Como dizem amigos meus, ser bissexual duplica as possibilidades de não se passar sozinho uma sexta à noite. Agora, tripliquem-na, olhando de facto para o mundo e esperando enfim encontrar o amor, ou pelo menos uma boa fruta.
Viva a Telenovelas. Vou passar a comprar!
Em relação aos dados dos estudos apresentados pela revista Telenovelas, referenciados pelo Tiago num post mais abaixo, impõe-se-me algumas considerações - causadas, é claro, pela surpresa.
20% de pessoas conquistaram alguém desconhecido? Independentemente de eu não perceber como é que se excluem desses os 4% que se encontraram de modo acidental, acho esse número estrondoso. Muitas vezes me indaguei - normalmente acontece quando uma pessoa está disponível e todas as pessoas à volta parecem desinteressantes - como é que as pessoas conhecem a sua cara metade fora daquele círculo já bem conhecido e "pesquisado". Pois bem, a minha resposta estava nos 37% e nos 32% referidos.
Agora - COMO? - 20% conquistam um desconhecido! 20%!
Afinal, há esperança. Não temos de esperar por uma festa em casa de amigos, não temos de ansiar por um encontro fortuito nas escadas do sítio em que estamos a trabalhar ou por um trabalho em comum, basta-nos oferecer flores como se fosse impulse.
Para todos os encalhados, uma palavra de esperança então: olhem bem para os desconhecidos. A vossa cara metade pode estar lá. E se frequentam transportes públicos, repartições públicas, centros comerciais, atenção redobrada.
Como dizem amigos meus, ser bissexual duplica as possibilidades de não se passar sozinho uma sexta à noite. Agora, tripliquem-na, olhando de facto para o mundo e esperando enfim encontrar o amor, ou pelo menos uma boa fruta.
Viva a Telenovelas. Vou passar a comprar!
SÓ TÊM UMA SEMANA!
Curtas Portuguesas em Estreia no S. Jorge
No dia 12 de Fevereiro, o cinema S. Jorge, em Lisboa, acolhe a estreia
comercial de quatro curtas metragens portuguesas - «O Nome e o N.I.M.», de
Inês Oliveira, «Rio Vermelho», de Raquel Freire, «Do Outro Lado do Tejo»,
de João Pinto Nogueira e «Por Que é Que Eu Não Disse Nada», de Miguel
Seabra Lopes.
O primeiro dia de exibição dos filmes contará com a presença
dos respectivos realizadores, dos actores e da equipa técnica, que falarão
sobre as suas obras. Serão 3 sessões diárias.
Curtas Portuguesas em Estreia no S. Jorge
No dia 12 de Fevereiro, o cinema S. Jorge, em Lisboa, acolhe a estreia
comercial de quatro curtas metragens portuguesas - «O Nome e o N.I.M.», de
Inês Oliveira, «Rio Vermelho», de Raquel Freire, «Do Outro Lado do Tejo»,
de João Pinto Nogueira e «Por Que é Que Eu Não Disse Nada», de Miguel
Seabra Lopes.
O primeiro dia de exibição dos filmes contará com a presença
dos respectivos realizadores, dos actores e da equipa técnica, que falarão
sobre as suas obras. Serão 3 sessões diárias.
segunda-feira, fevereiro 09, 2004
A lei dos amantes (16)
De acordos com estudos apresentados na revista Telenovelas:
- 37% dos casais conhecem-se entre clegas de trabalho e vizinhos;
- 32% apresentados por amigos;
- 20% conquistando alguém desconhecido;
- 4% de modo acidental - numa fila de banco, trânsito, num concerto
- 1% por meio de serviços - internet, agências de casamento, anúncios de jornais ou linhas telefónicas de encontros;
- 6% de outras formas.
De acordos com estudos apresentados na revista Telenovelas:
- 37% dos casais conhecem-se entre clegas de trabalho e vizinhos;
- 32% apresentados por amigos;
- 20% conquistando alguém desconhecido;
- 4% de modo acidental - numa fila de banco, trânsito, num concerto
- 1% por meio de serviços - internet, agências de casamento, anúncios de jornais ou linhas telefónicas de encontros;
- 6% de outras formas.
Leitura Partilhada
Falta ao Equador poder de síntese. As páginas 221 a 276 são dispensáveis. Só servem para MST mostrar que foi ler umas coisas sobre a Índia, que as traduziu mas não pensou em adaptá-las ao contexto português. A páginas 226, diz-se que existiam potentados na Índia que não eram maiores que o bairro de Chelsea ou a Escócia.
Falta ao Equador poder de síntese. As páginas 221 a 276 são dispensáveis. Só servem para MST mostrar que foi ler umas coisas sobre a Índia, que as traduziu mas não pensou em adaptá-las ao contexto português. A páginas 226, diz-se que existiam potentados na Índia que não eram maiores que o bairro de Chelsea ou a Escócia.
domingo, fevereiro 08, 2004
Não entres tão depressa nessa noite escura
Está nevoeiro em Lisboa. Está frio. Está um gato, lá em baixo, a mexer nos caixotes do lixo. As luzes de casa estão acesas, como se esperassem alguém. A cama ainda está fechada. O bule de chá já se rendeu duas vezes. Estou a ouvir o 1º concerto para violoncenlo de Elgar, interpretado pela Jacqueline Dupré.
Está nevoeiro em Lisboa. Está frio. Está um gato, lá em baixo, a mexer nos caixotes do lixo. As luzes de casa estão acesas, como se esperassem alguém. A cama ainda está fechada. O bule de chá já se rendeu duas vezes. Estou a ouvir o 1º concerto para violoncenlo de Elgar, interpretado pela Jacqueline Dupré.
sábado, fevereiro 07, 2004
sexta-feira, fevereiro 06, 2004
Antes quebrar que torcer
NOTA: Este é o último fim de semana e a derradeira oportunidade para se ver César Anticristo, a peça de Alfred Jarry que Ricardo Aibéo encenou. No Teatro do Bairro Alto, Ricardo Aibéo transporta-nos para um outro universo, entre o onírico e o terror, em que os nossos sentidos devem estar o mais atentos possível, correndo o risco de, em caso de tal não acontecer, poder ser fatal. Com uma energia fora de série, nada dependente do público - ou da falta dele - o conjunto de actores reage a estímulos que o próprio texto transmite, contorcendo-os e ganhando-lhes terreno.
O teatro de Alfred Jarry, de cujo título mais frequente é Rei Ubu, está na senda do surrealismo, sem o ser e no expressionismo sem o assumir. É toda uma outra realidade que pede disponiblidade por parte de quem vê, mas não condescendência. Não é esse o caminho e muito menos essa a intenção do teatro que Aibéo propõe. Depois de Hamlet, de Luis Buñuel (2000) e Duas farsas conjugais, Aibéo volta ao que não é fácil, imediato, reconhecível e objectivo. Antes quebrar que torcer parece ser o lema de um teatro que Ricardo Aibéo insiste em apresentar. E ainda bem que assim o é.
Assente numa corrente que a muitos poderá desagradar, seja pelo estilo ou pela forma, não pode, no entanto, deixar de se reconhecer o brilhante trabalho de perseverança em que Aibéo trabalha.
Se este comentário tem o valor que tem, não percam. Só até domingo.
NOTA: Este é o último fim de semana e a derradeira oportunidade para se ver César Anticristo, a peça de Alfred Jarry que Ricardo Aibéo encenou. No Teatro do Bairro Alto, Ricardo Aibéo transporta-nos para um outro universo, entre o onírico e o terror, em que os nossos sentidos devem estar o mais atentos possível, correndo o risco de, em caso de tal não acontecer, poder ser fatal. Com uma energia fora de série, nada dependente do público - ou da falta dele - o conjunto de actores reage a estímulos que o próprio texto transmite, contorcendo-os e ganhando-lhes terreno.
O teatro de Alfred Jarry, de cujo título mais frequente é Rei Ubu, está na senda do surrealismo, sem o ser e no expressionismo sem o assumir. É toda uma outra realidade que pede disponiblidade por parte de quem vê, mas não condescendência. Não é esse o caminho e muito menos essa a intenção do teatro que Aibéo propõe. Depois de Hamlet, de Luis Buñuel (2000) e Duas farsas conjugais, Aibéo volta ao que não é fácil, imediato, reconhecível e objectivo. Antes quebrar que torcer parece ser o lema de um teatro que Ricardo Aibéo insiste em apresentar. E ainda bem que assim o é.
Assente numa corrente que a muitos poderá desagradar, seja pelo estilo ou pela forma, não pode, no entanto, deixar de se reconhecer o brilhante trabalho de perseverança em que Aibéo trabalha.
Se este comentário tem o valor que tem, não percam. Só até domingo.
quinta-feira, fevereiro 05, 2004
América X
Escândalo por escândalo, a América puritana choca-se com a mama de Janet Jackson. Até as cerimónias de prémios irão ser afectadas. Os grammys e os óscars terão delays de 5 segundos, uma espécie de proto-censura prévia. O humor reina.
Escândalo por escândalo, a América puritana choca-se com a mama de Janet Jackson. Até as cerimónias de prémios irão ser afectadas. Os grammys e os óscars terão delays de 5 segundos, uma espécie de proto-censura prévia. O humor reina.
quarta-feira, fevereiro 04, 2004
Dinah, contra efeitos endogamicos
Os que, de acordo com o Bruno, seguem a endogamia como única forma de se envolverem, nunca ouviram a Dinah Washington. Ouçam-na e vejam lá se não sentem logo a roupa a descer pelo corpo, os braços a enlearem-se nos troncos, os lábios a aproximarem-se e as juras de amor a serem imposíveis de controlar.
Os que, de acordo com o Bruno, seguem a endogamia como única forma de se envolverem, nunca ouviram a Dinah Washington. Ouçam-na e vejam lá se não sentem logo a roupa a descer pelo corpo, os braços a enlearem-se nos troncos, os lábios a aproximarem-se e as juras de amor a serem imposíveis de controlar.
Hello
Com esta coisa de um vírus que nos entra pelo computador dentro e viola os ficheiros remetendo-os por e-mail para as diversas mailling lists, fico a saber que faço parte de outraas coisas que desconhecia. Já recebi de tudo: bancos, talhos, pornografias, centros católicos, agências de viagens, universidades, colégios, cinemas e privadíssimos. Deve ser a isto que chamam Big Brother
Com esta coisa de um vírus que nos entra pelo computador dentro e viola os ficheiros remetendo-os por e-mail para as diversas mailling lists, fico a saber que faço parte de outraas coisas que desconhecia. Já recebi de tudo: bancos, talhos, pornografias, centros católicos, agências de viagens, universidades, colégios, cinemas e privadíssimos. Deve ser a isto que chamam Big Brother
In memoriam
A propósito do falecimento de José Álvaro Morais, realizador de cinema iconoclasta e a descobrir, a 2: vai passar um belíssimo documentário devenu carta de amor chamado Ma femme chamada Bicho. Trata de Arpad Szenes e de Vieira da Silva e é arrepiante. Era assim - bicho, com pronunciação afrancesada que Szenes a tratava. Às 23h50.
A propósito do falecimento de José Álvaro Morais, realizador de cinema iconoclasta e a descobrir, a 2: vai passar um belíssimo documentário devenu carta de amor chamado Ma femme chamada Bicho. Trata de Arpad Szenes e de Vieira da Silva e é arrepiante. Era assim - bicho, com pronunciação afrancesada que Szenes a tratava. Às 23h50.
terça-feira, fevereiro 03, 2004
e a mim...
- ter passeios largos como em Barcelona e ver os portugueses na rua, a mostrarem-se, a passear, a sorrirem;
- mandar o santana também para Marte ou de preferência para mais longe;
- este sol e este calor mas com roupa primaveril;
- fazer do Jorge Sampaio Presidente da República vitalício para nos pouparmos ao Cavaco (não sofremos já o suficiente?);
- acabar com Rock in Rio;
- mais alegria!
- ter passeios largos como em Barcelona e ver os portugueses na rua, a mostrarem-se, a passear, a sorrirem;
- mandar o santana também para Marte ou de preferência para mais longe;
- este sol e este calor mas com roupa primaveril;
- fazer do Jorge Sampaio Presidente da República vitalício para nos pouparmos ao Cavaco (não sofremos já o suficiente?);
- acabar com Rock in Rio;
- mais alegria!
Apetecia-me...
- votar nas eleições americanas e expulsar o Bush para Marte;
- proibir o Euro 2004 em Portugal;
- rir da parvoíce da candidatura de Bush e Blair para Nobel da paz;
- falar de Santana Lopes e expô-lo ao ridículo;
- encontrar maneira de impor Sampaio como Presidente da República a respeitar;
- re-organizar a rede da Carris;
... ou ter tempo para ler o Proust, a Agustina, a Odisseia, o Mário de Carvalho e o Franco Alexandre, talvez aí me deixasse de utopias.
- votar nas eleições americanas e expulsar o Bush para Marte;
- proibir o Euro 2004 em Portugal;
- rir da parvoíce da candidatura de Bush e Blair para Nobel da paz;
- falar de Santana Lopes e expô-lo ao ridículo;
- encontrar maneira de impor Sampaio como Presidente da República a respeitar;
- re-organizar a rede da Carris;
... ou ter tempo para ler o Proust, a Agustina, a Odisseia, o Mário de Carvalho e o Franco Alexandre, talvez aí me deixasse de utopias.
segunda-feira, fevereiro 02, 2004
PRÉMIOS PARA QUE VOS QUERO
Mesmo concordando com parte dos argumentos apresentados pelo Tiago e menos com os de Pulido Valente, no essencial discordo. Acho que o Silva Melo fez muito bem em recusar o dito Prémio. Ontem, o Luís Miguel Cintra e a Lúcia Sigalho serviram-se do prémio para fazerem o seu protesto. Hoje, Silva Melo fá-lo de outra forma, mas o conteúdo continua a ser o mesmo.
É para mim revigorante saber que há quem possa recusar um prémio apenas por protesto. Recusá-lo porque sim, porque quem o dá não merece a pretensão de que pode atribuí-lo. Independentemente de tudo o resto, independentemente dos subsídios que os Artistas Unidos (e não o Silva Melo) têm recebido nos últimos anos, o criador teve um acto político, cuja validade e mérito (sim, mérito) passam por destruir a imagem deste governo idiota que nos rege.
Neste momento, ao artista cabe a tarefa essencial de resistir. Não basta criar, é preciso ter uma dimensão social e política muito mais global e envolvida. Hoje é muito mais arriscado ser artista, mas também muito mais genuíno. E quando digo genuíno, não falo de autenticidades existenciais de barriga cheia, falo mesmo de penúria económico-financeira. Provavelmente o mérito dos exemplos citados pelo Tiago (em post anterior) da Lúcia Sigalho e do Luís Miguel Cintra é que se aproveitaram do prémio para criar, e ainda assim manter o seu protesto. Nisso foram muito mais inteligentes. O meu favorito é mesmo o da Lúcia Sigalho, pois atinge completamente a ferida, aponta o dedo à hipocrisia destes prémios. Não serve mesmo para nada um prémio se se estiver a morrer à fome. Antes os prémios póstumos. Hoje o Jorge Silva Melo pode não ter sido tão inteligente, mas fez aquilo que se esperava dele, cuspir na autoridade, cuspir na condescência arbitrária dos senhores do poder. O facto de o fazer não invalida a justiça dos prémios atribuídos, com toda a certeza bem merecidos, apenas os delega para o plano em que realmente estão – no plano do dinheiro e do poder.
Para mim, é um sinal de optimismo ver um dos mais “oficiais” artistas do nosso país (como bem indica Vasco Pulido Valente) ter um gesto tão solidário e solitário como este. O que condenam e acusam em Silva Melo é o que mais gosto nele: a arrogância de se achar merecedor de tudo o que o Estado lhe possa dar excepto um prémio. Ele vive na plena consciência que é um direito intrínseco ser suportado pelo Estado, mas nunca, mesmo nunca, ser reconhecido por um poder político. Essa arrogância é imprescendível para tapar a boca aos senhores do poder. Eles que tenham a humildade de se calar e de se colocarem no seu lugar.
Vivam os artistas! Obrigada, Jorge Silva Melo!
Mesmo concordando com parte dos argumentos apresentados pelo Tiago e menos com os de Pulido Valente, no essencial discordo. Acho que o Silva Melo fez muito bem em recusar o dito Prémio. Ontem, o Luís Miguel Cintra e a Lúcia Sigalho serviram-se do prémio para fazerem o seu protesto. Hoje, Silva Melo fá-lo de outra forma, mas o conteúdo continua a ser o mesmo.
É para mim revigorante saber que há quem possa recusar um prémio apenas por protesto. Recusá-lo porque sim, porque quem o dá não merece a pretensão de que pode atribuí-lo. Independentemente de tudo o resto, independentemente dos subsídios que os Artistas Unidos (e não o Silva Melo) têm recebido nos últimos anos, o criador teve um acto político, cuja validade e mérito (sim, mérito) passam por destruir a imagem deste governo idiota que nos rege.
Neste momento, ao artista cabe a tarefa essencial de resistir. Não basta criar, é preciso ter uma dimensão social e política muito mais global e envolvida. Hoje é muito mais arriscado ser artista, mas também muito mais genuíno. E quando digo genuíno, não falo de autenticidades existenciais de barriga cheia, falo mesmo de penúria económico-financeira. Provavelmente o mérito dos exemplos citados pelo Tiago (em post anterior) da Lúcia Sigalho e do Luís Miguel Cintra é que se aproveitaram do prémio para criar, e ainda assim manter o seu protesto. Nisso foram muito mais inteligentes. O meu favorito é mesmo o da Lúcia Sigalho, pois atinge completamente a ferida, aponta o dedo à hipocrisia destes prémios. Não serve mesmo para nada um prémio se se estiver a morrer à fome. Antes os prémios póstumos. Hoje o Jorge Silva Melo pode não ter sido tão inteligente, mas fez aquilo que se esperava dele, cuspir na autoridade, cuspir na condescência arbitrária dos senhores do poder. O facto de o fazer não invalida a justiça dos prémios atribuídos, com toda a certeza bem merecidos, apenas os delega para o plano em que realmente estão – no plano do dinheiro e do poder.
Para mim, é um sinal de optimismo ver um dos mais “oficiais” artistas do nosso país (como bem indica Vasco Pulido Valente) ter um gesto tão solidário e solitário como este. O que condenam e acusam em Silva Melo é o que mais gosto nele: a arrogância de se achar merecedor de tudo o que o Estado lhe possa dar excepto um prémio. Ele vive na plena consciência que é um direito intrínseco ser suportado pelo Estado, mas nunca, mesmo nunca, ser reconhecido por um poder político. Essa arrogância é imprescendível para tapar a boca aos senhores do poder. Eles que tenham a humildade de se calar e de se colocarem no seu lugar.
Vivam os artistas! Obrigada, Jorge Silva Melo!
Novas leituras
A propósito do prémio Almada a Jorge Silva Melo, e na sequência do post anterior "Como um rasgão na paisagem", leio hoje o que não li no sábado. Vasco Pulido Valente dixit:
O encenador e actor Jorge Silva Melo recusou um prémio de 25 mil euros, que lhe fora atribuído por um organismo do Ministério da Cultura. Disse ele: «Não gosto de prémios do Estado, porque acredito que o artista é por natureza um traidor ao poder instituído.» «O artista», acrescentou amavelmente, «desenvolve a sua actividade contra o Estado» e por isso só deve ser «reconhecido» pelos seus pares. Em resumo: qualquer distinção dada pelo sustentáculo de uma ordem injusta, por esse inimigo nato da liberdade criadora, não honra, compromete. O Ministério bem se tentou apropriar com blandícias do subversivo Silva Melo: mas desta vez não conseguiu. O homem serenamente não cedeu e a companhia (de teatro) que fundou e dirige vai continuar a brandir, face ao compromisso e à fraqueza, o seu altivo «lema»: «Sem Deus, nem chefe.» Este episódio mereceu, e com razão, o entusiasmo da Esquerda, que fotografou e ouviu reverentemente o herói, sem o mais leve comentário ou sequer uma pergunta a despropósito. Tanta independência inspira com certeza terror e tremor. Até aqui tudo bem. Excepto por um pequeno pormenor: Silva Melo e a sua companhia vivem do Estado, de que receberam, em 2003, 450 mil euros. Por outras palavras, o artista «trai» o poder instituído com a espórtula do poder instituído. Nesta operação a consciência delicada de Silva Melo não vê a menor dificuldade. Acha presumivelmente que está no seu direito e que «Sem Deus, nem chefe» não inclui o Ministério da Cultura ou o dinheiro do contribuinte. Por uma curiosa contorção moral o prémio é que o incomoda. Uma birra absurda? Claro que não. Porque o prémio revela duas coisas que ele gostava de esconder. Primeiro, que o Estado o considera um artista oficial. E, segundo, como corolário, que toma as pretensões «revolucionárias» do teatro dele pelo que na verdade são, ou seja, uma parlapatice inócua. Sem hipocrisia, o subsídio ofende.
A propósito do prémio Almada a Jorge Silva Melo, e na sequência do post anterior "Como um rasgão na paisagem", leio hoje o que não li no sábado. Vasco Pulido Valente dixit:
O encenador e actor Jorge Silva Melo recusou um prémio de 25 mil euros, que lhe fora atribuído por um organismo do Ministério da Cultura. Disse ele: «Não gosto de prémios do Estado, porque acredito que o artista é por natureza um traidor ao poder instituído.» «O artista», acrescentou amavelmente, «desenvolve a sua actividade contra o Estado» e por isso só deve ser «reconhecido» pelos seus pares. Em resumo: qualquer distinção dada pelo sustentáculo de uma ordem injusta, por esse inimigo nato da liberdade criadora, não honra, compromete. O Ministério bem se tentou apropriar com blandícias do subversivo Silva Melo: mas desta vez não conseguiu. O homem serenamente não cedeu e a companhia (de teatro) que fundou e dirige vai continuar a brandir, face ao compromisso e à fraqueza, o seu altivo «lema»: «Sem Deus, nem chefe.» Este episódio mereceu, e com razão, o entusiasmo da Esquerda, que fotografou e ouviu reverentemente o herói, sem o mais leve comentário ou sequer uma pergunta a despropósito. Tanta independência inspira com certeza terror e tremor. Até aqui tudo bem. Excepto por um pequeno pormenor: Silva Melo e a sua companhia vivem do Estado, de que receberam, em 2003, 450 mil euros. Por outras palavras, o artista «trai» o poder instituído com a espórtula do poder instituído. Nesta operação a consciência delicada de Silva Melo não vê a menor dificuldade. Acha presumivelmente que está no seu direito e que «Sem Deus, nem chefe» não inclui o Ministério da Cultura ou o dinheiro do contribuinte. Por uma curiosa contorção moral o prémio é que o incomoda. Uma birra absurda? Claro que não. Porque o prémio revela duas coisas que ele gostava de esconder. Primeiro, que o Estado o considera um artista oficial. E, segundo, como corolário, que toma as pretensões «revolucionárias» do teatro dele pelo que na verdade são, ou seja, uma parlapatice inócua. Sem hipocrisia, o subsídio ofende.
Hoje
No Instituto Franco-Português, em Lisboa, às 21h30, um documentário de Nicolas Philippert, o realizador de Être et Avoir. A não perder.
No Instituto Franco-Português, em Lisboa, às 21h30, um documentário de Nicolas Philippert, o realizador de Être et Avoir. A não perder.
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