sábado, junho 17, 2006

Clipping Alkantara (VIII): I am here, de João Fiadeiro

I am here
de João Fiadeiro
Centro Cultural de Belém
Hoje, 21h

excerto da crítica ao espectáculo publicada neste blog a 16 Maio 2004

Se, por um lado, João Fiadeiro aposta no desconhecimento do espectador acerca do que se vai passando no palco, dá-lhe - coisa rara - oportunidade para escutar, efectiva e sensorialmente o som que os movimentos fazem. Dessa forma o espectador está mais perto do que nunca do que se está a passar. Pode "ver", efectivamente, o que quiser. No entanto, Fiadeiro envolve-o numa sequencial cadência que lhe permite começar a estabelecer um padrão que, imagina-se, culminará na total ocupação gráfica e pictórica do papel de cenário que é utilizado como suporte para os contornos da figura do intérprete, fotografado no escuro por uma câmara de infra-vermelhos. É quando essa cadeia se rompe - e novamente se romperá para a sequência final do espectáculo - que a desorientação no espectador acontece. [...] O aleatório e o eventual deixam de o ser a partir do momento em que "sabemos" que na escuridão João Fiadeiro dança e que os perfis desenhados no papel de cenário tomam formas cuja interpretação cabe a cada um relacionar. As luzes apagadas, porque dão ilusoriamente toda a liberdade ao espectador, obrigam-no a uma atenção redobrada a todo o tipo de acontecimentos.




O “formalismo” no qual um espectáculo se organiza, dado pela fixação de gestos e sequências, não poderá contradizer o modo como esse processo [Composição em Tempo Real] se desenvolve?

É um perigo. Mas isso é verdade em projectos de grupo. Uma coisa é fazeres isso sozinho e isolado como eu fiz, por exemplo, no I am here, um produto cem por cento CTR. A ideia é que se consiga num grupo fazer a mesma coisa. Já não depende de ti, mas de ti no meio dos outros, no que isso exige de uma qualidade de auto-observação e auto-reflexão… Há outros aspectos, como por exemplo, a escrita dramatúrgica. Saber até que ponto podemos ou não fazer com que o método interfira não só na produção da matéria, mas na sua preservação, e na capacidade de reprodução, sem que perca qualidades à medida que vai sendo reproduzida. E isso é um grande desafio. Há pouco tempo apercebi-me de um equívoco de foco que tinha em relação à própria metodologia, que achava ter como principal objectivo entregar àquele corpo a credibilidade que só a primeira vez pode produzir. De alguma maneira eu negava-me a fixar e a única coisa que fazia era desenhar uma estratégia de condicionalismos. Eu condicionava a acção, mas não intervinha na acção, porque estava convencido que era no facto de ser a primeira acção, a primeira vez, que estava associada a credibilidade. Não deixa de ser verdade, mas é perfeitamente possível repetir-se e preservar a credibilidade, desde que naquele momento da repetição estejas também presente. Por outro lado, há uma coisa que sempre me fascinou muito, que é a ideia de ir mais longe na complexidade que uma frase pode ter desde que haja tempo de olhar para ela, assentar, deixar morrer…

É o corpo que está ao serviço do processo criativo ou o processo que vai caucionando o discurso que o próprio corpo produz?
Eu acho que é o corpo que está ao serviço de um processo criativo. É esse o objectivo principal desta metodologia, para além dos processos e vantagens periféricas ou paralelas que possa ter ao nível do auto-conhecimento e da própria solidificação da “personagem” uma vez construída. Estamos a falar aqui de uma fase de trabalho anterior à apresentação, anterior à “personagem”. Estamos à procura.

Mas é anterior até mesmo à concepção?

Exactamente.

O processo não existe como ponto para chegar a algo que possa ser questionado directamente por quem vê?

Sim, mas esse “algo” só ganha forma no fim. Não existe antes, ao contrário de outros processos. Só no fim é que vamos perceber o que fizemos e porque é que o fizemos. E saber se isso que fizemos tem ou não consistência para ser depois trabalhado de uma maneira já completamente distanciada das opções do próprio intérprete. Se tivermos a imagem do escultor tradicional que trabalha em pedra, estamos à procura da pedra. E de uma pedra que já tenha a escultura em potência.

2 comentários:

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

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