terça-feira, dezembro 12, 2006

Teatro Camões torna-se, finalmente, na casa da dança


Apesar da anunciada fusão da Companhia Nacional de Bailado(CNB) com o Teatro Nacional de S. Carlos, e toda a retórica re-organização e restruturação que isso vai implicar, o Teatro Camões, sede da CNB, assume no próximo ano o desejo de ser visto como a casa da dança. Programado por Mark Deputter, também director artístico do Alkantara festival, e dirigido por Ana Pereira Caldas, também directora da CNB [ler aqui comentário de Ana Pereira Caldas sobre essa nomeação], o Camões deu já a conhecer alguns dos nomes que no próximo semestre se apresentarão em Lisboa. O programa inclui Pina Bausch, William Forsythe, Olga Roriz, Meg Stuart, Mathilde Monnier, Thomas Hauert, Rui Horta, Vasco Wallenkemp, Ohad Naharin, Rui Lopes Graça, Benvindo Fonseca e Gagik Ismailian, entre outros nomes de jovens coreógrafos integrados em ciclos novos, como Canto e Dança já em Fevereiro, ou outros, como Let's Dance, que encontram assim espaço de continuação depois da primeira edição no passado mês de Julho.

Esta programação, que em Abril servirá para comemorar os 30 anos da CNB, parece querer imprimir novas forças de relação, seja dentro da própria companhia, com o público, com os criadores e as outras instituições. Desde logo porque volta a trazer a Lisboa alguns nomes reconhecíveis pelo público do extinto Ballet Gulbenkian, como Bigonzetti, Ismailian e Naharin, que assim dão ao ensemble da CNB uma responsabilidade de equilíbrio entre o papel de uma companhia de repertório clássico e apresentação de criadores contemporâneos que podem apelar a um público mais vasto. Mas também porque, no caso de Olga Roriz, e no ano em que se espera poder ser lida finalmente a biografia que a jornalista cultural e crítica Mónica Guerreiro escreveu, haverá a oportunidade de acompanhar diferentes trabalhos de épocas e registos diferentes: Treze gestos de um corpo, criado em 1987 para o Ballet Gulbenkian, Pedro e Inês, de 2003, para a CNB e Daqui em Diante, deste ano, para a sua companhia.

Meg Stuart será alvo de um ciclo de peças, em parceria com o CCB e a Culturgest, no mês de Julho, dando-se assim oportunidade para perceber as implicações do trabalho de uma das mais iconoclastas criadoras internacionais, e Pina Bausch virá em Abril com For the Children of Yesterday, Today, and Tomorrow, uma peça de 2002, que não faz parte do ciclo de peças que a coreógrafa alemã anda a dedicar a cidades internacionais, e provoca o encontro da dança apaixonada de Bausch com uma certa ideia de esperança a partir de elementos que evocam os índios norte-americanos.

De salientar ainda que, para ciclo Canto e Dança, o Camões apresentará o extraordinário espectáculo-concerto de Mathilde Monnier e Katerine, 2008 Vallée (na foto), que junta a dança frenética e quase esquizofrénica de Monnier com a excentricidade deste cantor que faz lembrar um Tom Jones, versão trash (sim, difícil de imaginar, mas de rendição completa).

Outros nomes, e outras lógicas de programação, fazem parte dos espectáculos que o Camões apresentará em 2007, sendo certo que se o orçamento assim deixar e a absurda fusão não impedir, Lisboa passará a contar com mais uma sala de efectiva programação de dança que amplia o conceito que temos de dança.

1 comentário:

paulu disse...

Desde que o Ballet Gulbenkian foi aniquilado - “extinto” será o termo correcto, mas parece-me demasiado asséptico para o que por lá se passou - a dança em Portugal ficou com um buraco aberto do tamanho de uma boca que perdeu as palavras. Talvez seja injusto (e estúpido) pedir à CNB que preencha a mudez criada, mas se o faz por vontade e vocação, ainda bem, que tenho saudades das danças do BG. Que continuem a fazer por dentro a sua bela casa à beira Tejo, são os meus votos.

Bela escolha de coreógrafos. Na lógica que estão a seguir, só fico com pena por não estarem lá também Marie Chouinard e Mats Ek, mas pode ser apareçam numa próxima temporada.

Quanto à fusão… Que se pode esperar? Pertence a um dos três verbos da gestão moderna: extinguir, cortar, fundir. Até um dia destes ficar tudo tão economicamente racionalizado que nada se distinguirá de coisa nenhuma.