O Diário de Notícias dá hoje conta da intenção do Teatro Praga (TP) processar judicialmente o Teatro Nacional D. Maria II (TNDMII), por incumprimento de contrato. De acordo com a programação dada a conhecer à imprensa em Janeiro de 2006, ainda sob a direcção de António Lagarto, o TNDMII seria co-produtor dos dois espectáculos que o Teatro Praga tinha agendado: a reposição de 5***** , estreado no âmbito das comemorações do Dia Mundial do Teatro 2005, e a estreia de Worst of…, ambos na semana de 05 a 11 de Junho. Ambos os espectáculos estariam um mês em cena. Contudo, a direcção de Carlos Fragateiro e José Manuel Castanheira optou por cancelar as duas apresentação, substituindo-as pelo MITE – Mostra Internacional de Teatro de Lisboa 06, evento que rondou os 400 mil euros. Em declarações exclusivas ao Melhor Anjo, Pedro Penim, actor e membro do TP (na foto), dá conta do que realmente se passou.
"Deixámos de contactar com o TNDMII, dado o seu director nunca estar disponível para falar connosco." - Pedro Penim
Solicitamos uma reunião ao actual director, imediatamente após a sua tomada de posse, porque queríamos confirmar se as condições contratualizadas se manteriam. Fomos informados da intenção de programar o MITE nessa reunião de 2 de Março, tendo-nos sido, nessa mesma reunião, a utilização alternativa da sala estúdio. Informámos imediatamente que essa alteração quereria dizer que as produções seriam canceladas quer por razões técnicas (5***** dependia da existência da plataforma elevatória no palco da Sala Garrett) e artísticas (Worst of… estava a ser concebido exclusivamente para a referida sala).
Os contratos estavam já assinados? O que diziam em relação à utilização das salas do TNDMII?
Sim, um para cada espectáculo, sendo muito claros de que se destinavam à Sala Garrett. 5*****, apesar de ser uma reposição, e ter estreado enquanto produção do TNDMII, seria feito em co-produção. Worst of…, uma criação nova, também seria uma co-produção Teatro Praga/TNDMII.
O que se seguiu?
Comunicámos as intenções do TNDMII aos membros do TP e decidimos não aceitar a proposta de alteração. Considerámos ainda que, por motivos que nos eram alheios, as produções teriam sido canceladas. A 15 de Março enviámos ao TNDMII uma carta em que comunicamos a não aceitação das alterações ao contrato e solicitamos uma resolução da questão, dado que é o TNDMII o responsável pela situação.
Qual o valor da indemnização solicitada?
Não falamos de valores por enquanto. Mas os dois contratos assinados com a anterior direcção prevêem uma participação do TNDMII num total de 51 mil euros, enquanto co-produtor.
Qual o tempo de aviso prévio indicado no contrato para a hipótese de cancelamento?
Não sei precisar. Mas o próprio contrato inclui uma cláusula onde, no caso de cancelamento por parte do TNDMII, este se responsabilizará pelos danos.
Houve resposta a essa carta?
Desde a carta de 15 de Março até haver uma resposta da parte do teatro passaram-se cerca de três meses, sempre com diversas solicitações nossas para uma resolução rápida, dado que se aproximavam as datas que estavam previstas para a estreia dos espectáculos.
Quando é q decidem partir para uma acção judicial? Antes ou depois da proposta do TNDMII?
A primeira reunião do nosso representante jurídico com o advogado do TNDMII é a 30 de Maio, e só passado umas duas semanas é que foi feita a única proposta do TNDMII. O advogado do Teatro diz-nos que querem resolver a questão rapidamente (!) e que vai fazer brevemente uma proposta de indemnização.
É essa contraproposta que, ao Diário de Notícias (DN), vocês acusam de ser ridícula.
Sim. Há uma contraproposta nossa que nunca teve resposta até agora. Depois da contraproposta enviámos diversas cartas ao Instituto das Artes (IA), ao Ministério da Cultura, bem como ao assessor cultural do Primeiro-Ministro [Alexandre Melo], onde dávamos conta da situação. Mas fomos recebidos unicamente pelo Secretário de Estado [da Cultura, Mário Vieira de Carvalho], que em reunião disse que não iria tomar nenhuma atitude perante esta situação. Compreendia-a e esperava que se resolvesse, mas afirmava que o TNDMII tem autonomia para resolver as suas próprias questões.
E em relação ao IA? Que resposta obtiveram?
Com o IA tivemos uma reunião, com o sub-director [Orlando Farinha], onde explicámos toda a situação. Dado que não havia nenhuma resposta do Nacional e que não iria ser tão cedo que poderíamos ter a verba da indemnização disponível, confirmámos o cancelamento.
O IA levantou alguma questão relativamente ao cumprimento do contrato bianual que vos une?
O sub-director compreendeu a situação na totalidade.
Portanto, não fez depender o pagamento de nenhuma tranche da resolução do problema?
Não. É verdade que nessa altura, a segunda tranche do apoio ainda não tinha sido transferida. Mas o IA é apenas uma das fontes de financiamento do Teatro Praga, com 70000€ por ano. Não é maioritário o seu peso no nosso orçamento anual. Existem ainda, e maioritariamente, apoios de co-produções para os espectáculos, bem como as vendas de espectáculos. Propusemos outro espectáculo em substituição, em co-produção com o CaPA/DEVIR, em Faro, que entretanto também foi cancelado porque a situação se arrastou ainda mais tempo, e o Teatro Praga deixou de conseguir garantir a sua parte na co-produção. O orçamento anual que havia sido apresentado estava, obviamente e dados os valores envolvidos, muito dependente da co-produção com o TNDMII.
Tentaram chegar à fala com a Administração do TNDMII e a Sociedade Anónima que o gere?
Não. Deixámos de contactar com o TNDMII, dado o seu director nunca estar disponível para falar connosco.
Esperam uma reacção do ex-director do TNDMII, António Lagarto, a esta situação?
Os espectáculos que estão referidos nos contratos partem de negociações artísticas e técnicas com um programador, precisamente o António Lagarto. Estas negociações foram feitas com muito cuidado e com uma discussão dos projectos que não se fez em dois dias. A proposta foi nossa e houve uma abertura e uma capacidade de comunicação que é precisamente aquela que achamos válida entre programadores e artistas. Por isso é natural que o António Lagarto reaja a esta situação.
[O Melhor Anjo contactou o ex-director, que respondeu não comentar assuntos relacionados com o TNDMII]
Em declarações ao DN, falas em situação desesperada no Teatro Praga, nomeadamente ao nível dos pagamentos de salários e cumprimentos de compromissos, prejudicando a programação prevista para 2006. Queres especificar?
Sim. Cancelámos os pagamentos de alguns dos ordenados de trabalhadores associados à estrutura. Contudo, mantivemos as produções que já estavam previstas em contrato com o IA, nomeadamente a nova criação Shall We Dance 3 que foi estreada no CENTA e a reposição de Shall We Dance 2 em Lisboa [ambas em Agosto]. Tudo o resto foi cancelado. Estamos numa situação de sobrevivência mínima até ao fim do ano.
Que pode pôr em causa as produções para 2007?
Não põe em causa qualquer produção para 2007, mas hipotecou a programação de 2006 e a própria estrutura da companhia. Neste momento não estamos a trabalhar como fizemos no ano de 2005. Para 2007 temos outras co-produções previstas q não foram alteradas. Para já a situação financeira é a primeira a deteriorar-se. Veremos que outras consequências resultarão de todo este caso.
O que achas que o Ministério deveria ter feito?
Acho que isto é um caso grave de má gestão das escolhas da direcção. E como o Teatro Praga é também financiado pelo MC, é da responsabilidade do mesmo intervir numa situação de fragilização de uma estrutura apoiada. As consequências deste cancelamento e da sua não resolução estão ainda a ser avaliadas por nós. Até ao momento afastámos esta situação da comunicação social porque sempre confiámos na boa-fé da actual direcção do TNDMII. Mas esgotámos os recursos e a paciência.
Que confiança depositas na direcção do TNDMII para ver resolvida a situação?
Não consigo compreender a atitude. Não há resposta alguma à contraproposta que fizemos. Só hoje pelo DN tivemos eco dessa contraproposta. Enviámos no início de Setembro uma carta onde finalmente dávamos um prazo ao TN para resolver a questão, mas mais uma vez não houve qualquer resposta. Não há aparentemente nenhuma vontade de negociar uma situação provocada por escolhas artísticas da actual direcção. Acho que há na realidade uma desconsideração em relação a tudo o que se passa com o grupo em consequência de um cancelamento, que como é óbvio, e espero que Carlos Fragateiro compreenda isso, tem grandes implicações no nosso orçamento, no nosso percurso e na nossa programação. Por esta altura já o teria acontecido e circulado pelo país. Estava, aliás, prevista a colaboração do Espaço do Tempo. Ou seja, os espectáculos foram cancelados, o MITE aconteceu, mas nós, e não só nós já que o Espaço do Tempo também tinha incluído o Worst of… na sua programação, fomos prejudicados.
Esperam voltar ao Nacional, na direcção de Carlos Fragateiro? Se o TNDMII voltasse atrás, aceitariam fazer as peças?
Não temos qualquer intenção de fazer tal. Temos a nossa programação definida para 2007 e 2008. Gostamos de colaborar com quem entende o nosso percurso artístico e com quem o respeita. E é isso que faremos nos anos seguintes. Questões como estas queremos evitá-las a todo o custo e tentámos evitá-las. Aceitamos as decisões desta direcção. Aceitamos as directivas que o Ministério que impor ao Teatro Nacional D. Maria II. Contudo não concordamos e não queremos ser vítimas delas.
Sabes se esta situação aconteceu com outros espectáculos ou só com vocês?
Não tenho qualquer informação a esse respeito.
Como comentas a saída de Carlos Fragateiro do Teatro da Trindade [anunciado pelo blog na terça-feira, e hoje confirmada pelo DN e o Público]?
A situação já era do conhecimento público desde que Carlos Fragateiro tomou posse no TNDMII. Parece-me extraordinário que dois artigos de opinião e a pressão de alguns jornalistas façam a diferença. Sendo consequente com o seu discurso Carlos Fragateiro deveria ter imediatamente passado a direcção ao seu braço direito. Como agora aconteceu. Agora em vez de dois teatros irmãos serão dois teatros primos.
Qual o papel que achas que deveria ocupar o Teatro da Trindade?
O Teatro da Trindade pertence ao INATEL e há claramente obrigações de ordem programática que respondem às necessidades desse organismo. Ou pelo menos sempre foi esse o discurso do anterior director. Acho interessante a sugestão do [encenador] Luís Miguel Cintra [jornal Expresso, 23 Setembro], de fazer uma programação rotativa com uma estrutura que não estivesse obrigada a um estilo e a uma linha de pensamento única. Teria de haver uma grande sensibilidade e um conhecimento de campo muito especial da parte do INATEL para tomar tal decisão. E aqui na “América do Sul” essa é uma perspectiva que vejo longínqua em alguns sectores.
Em complemento:
Fragateiro deixa direcção do Teatro da Trindade in DN, hoje
O que deve ser o Teatro Nacional, por PEdro Penim, in Publico, 22/01/06
Fotografia de José Luis Neves
2 comentários:
Qual é esta moda do teatro praga? a conversa do outro miudo com o LMC no Expresso... isto está tudo louco?
O Luis Miguel Cintra, grande encenador e genial actor, nunca foi um brilhante pensador e portanto se percebe que perca tempo com uma conversa estéril e contraditória de uma criança desprovida de talento a querer chamar a atenção. o LMC ou está a ficar senil ou apaixonado
senil e apaixonado. hehehe
Enviar um comentário