domingo, junho 11, 2006

Clipping Alkantara (VI): Flatland, de Patrícia Portela

11 a 14 Junho, 20h

excerto da declaração do júri do Prémio Maria Madalena Azeredo Perdigão 2004 atribuído a Flatland I

Se Flatland escapa à mais despretensiosa tentativa de definição, é porque instaura um imaginário múltiplo de referências, servindo-se de um dos mais acessíveis, e complexos, meios de expressão: a linguagem. Tanto a palavra dita – fonema – como a palavra escrita – morfema – são manipuladas enquanto objectos performativos. Essa apropriação de matérias que não são usualmente conjugadas propicia um jogo de contrastes: entre a voz em tempo real, própria ao género dramático, e voz mediada pela tecnologia, que nos dá a técnica cinematográfica; entre a simplicidade formal quase “antropológica” do livro, lugar de imagens “antes da imagem”, e a própria utilização da imagem, através do meio tecnológico que lhe dá existência; entre a solidão com que se debate o habitante de Flatland, preso no lugar da sua história, e a realidade desse lugar como território de todas as liberdades, da escrita animada à viagem fílmica, do lugar da ciência (os desenhos anatómicos) ao lugar da ficção (de Oz a James Bond). Para o espectador, envolvido noutras buscas, trata-se de conquistar a relação com este objecto visual, dado que a projecção do livro tem implicações na arquitectura do espaço e na experiência física, que exige uma deslocação do olhar. Por fim, a aparente contradição que é convocar uma narrativa que conta a busca da tridimensionalidade através de um meio bidimensional.



Ancorada nesta manipulação da ilusão teatral, Flatland apresenta-se ao espectador como o lugar-último para a liberdade criativa; uma espécie de porta aberta para o mundo real como lugar de coisas inatingíveis que, no limite, já conhecemos. [...] Com esta proposta de grandes proporções visuais, Patrícia Portela dá-nos a oportunidade de mudarmos o curso da História através de um espectáculo de resistência baseado no uso da palavra escrita, cénica e coreográfica. E um uso que implique um corpo, um som, um cheiro, uma memória. Portanto, a palavra como conceito, uma vez que o conceito é. Flatland destaca-se pela forma como usa uma forte estrutura dramatúrgica, sublinhando a importância da apreensão e provando que há implicações numa exposição.