terça-feira, fevereiro 21, 2006

Silêncio Nacional

Fontes seguras tinham afirmado ao Melhor Anjo que Carlos Fragateiro iria dar conta da sua programação ontem, 20 de Fevereiro. Ao que parece o indigitado director do Teatro Nacional D. Maria II disponibilizou-se logo para desmentir tal informação, sem no entanto adiantar o que fosse. A sua política triangular continua por apresentar e o TNDMII segue, ligeiro, na indefinição. A juntar a isto está o silêncio de José Socrates, que ainda não deu conta da carta que quase 2000 agentes culturais lhe mandaram, o de Isabel Pires de Lima, atrapalhada com o imbróglio Berardo, ou do INATEL, que tutela o Trindade e nada disse acerca da saída de Fragateiro, do fecho para obras do teatro e de um nome para director. Mais de um mês depois e nada parece ter mudado.

As únicas informações que saem do Teatro Nacional dão conta do sucesso da peça A Profissão mais velha que viu estendida a sua carreira de apresentações até 02 de Abril. Trata-se de um segundo prolongamento, depois de terem sido anunciadas representações até 26 de Fevereiro e devido às lotações esgotadas. A decisão, que assenta naturalmente na qualidade do trabalho das cinco actrizes (Fernanda Montemor, Glória de Matos, Maria José, Lurdes Norberto e Lia Gama) e da encenadora, Fernanda Lapa, não pode deixar de ser lida também como uma forma de adiar o inevitável: a nova programação de Fragateiro. Estreada em plena crise no TNDMII, a peça surge como uma espécie de testamento do legado de António Lagarto: estamos finalmente perante um caso de sucesso dentro do Teatro Nacional e que, ainda por cima combina exactamente as razões que mandaram à substituição do director: aproximação de públicos. No dia em que fui ver a peça (crítica dentro de dias) havia público (pela primeira vez no espaço) que tirava fotografias ao interior da sala, como se o teatro fosse fechar.

Se é certo que dificilmente fechará, a verdade é que sabe-se que foram já canceladas as comemorações do Dia Mundial do Teatro, agendadas para 18 e 19 Março. A iniciativa, que o ano passado encheu o Teatro Nacional com o mais diversificado dos públicos, pretendia abrir as portas do edifício numa iniciativa desempoeirada que equilibraria teatro e música. O sucesso de 2005 era mais do que justificação para garantir nova edição. Parece que já não vai ser assim. E da mesma forma que foram canceladas iniciativas, sem que outras fossem anunciadas em sua substituição (ou seja, a um mês do Dia Mundial do Teatro não se sabe o que vai apresentar aquele que é o 1º teatro do país), outras aguardam por confirmação. O Melhor Anjo sabe de companhias e criadores que ainda aguardam uma reunião com Carlos Fragateiro para saberem se as suas co-produções avançam.

Sabendo que há contratos firmados, verbas dispendidas e programações indicadas, o problema de Carlos Fragateiro não é só de o decidir o que vai fazer com uma programação que, tendo sido apresentada no início de Janeiro através da publicação de anúncios na imprensa, certamente já não corresponde à vontade quer da tutela, quer do novo director. Estando no início de um novo ano e, segundo práticas correntes, a meio de uma temporada, é impressionante pensar que nada se conhece daquilo que vai ser o Teatro Nacional nos próximos meses.

Uma programação que incluía a apresentação (finalmente!!) de Medeia, de Eurípides, ou um programa de comemoração dos 160 anos do TNDMII, que continuava a recuperação da ligação estreita com a Escola Superior de Teatro e Cinema, com a apresentação dos exercícios finais dos alunos e equilibrava textos contemporâneos nacionais e estrangeiros com clássicos da dramaturgia, parece ter sido posto de lado. Pensar que há projectos que deveriam estrear dentro de dois meses e ainda nada se sabe é vergonhoso para uma casa que quer ser exemplo. Não admira que este assunto diga tão pouco às gentes.

Não se consegue compreender como é que obedecendo a lógicas financeiras e querendo rentabilizar o Teatro Nacional, a tutela permite que se desperdicem as centenas de euros já investidos. Carlos Fragateiro e Isabel Pires de Lima dão cobertura à famosa frase de Garret quando disse que o teatro era uma arte que não prosperava num país que não a considerava. Que esta situação não seja alvo de discussão permanente, atenta e incisiva, revela bem o peso que a cultura têm neste país. O slogan Uma casa com vida, que assina toda a documentação saída do TNDMII parece, agora, referir-se a uma vida post-mortem. Nunca o epíteto "túmulo do Rossio", usado para designar o Teatro Nacional no princípio do século XX fez tanto sentido como agora.