sexta-feira, abril 28, 2006

Dossier Dia Mundial da Dança III: O problema da hiper-exposição



Projecto de formação DANCE apresentou performances na exposição Mouvement des Images, em Paris

O imenso arquivo audiovisual do Centre Georges Pompidou, em Paris, abriu as portas e instalou-se no quarto andar do edifício do Beaubourg para uma exposição intitulada Mouvement des Images, patente até 29 de Janeiro de 2007 e comissariada por Philippe-Alain Michaud.

Foi no âmbito desta exposição e intregrado no programa Jeudi's, que o Centre Pompidou tem por hábito organizar em parceria com as escolas de arte, que o projecto de formação em dança D.A.N.C.E. - Danse Apprentice aCross Europe, se apresentou pela primeira vez em Paris, no passado dia 13 de Abril. Apresentação que, em bom rigor, constituiu a primeira apresentação pública do projecto, uma vez que as anteriores, no início deste ano, eram simples exercícios de repetição de sequências da peça Noces, de Angelin Preljocaj, que, curiosamente esteve em exibição no Théâtre de la Ville na mesma altura.

Este projecto DANCE, dirigido artisticamente pelos coreógrafos Angelin Preljocaj, Fréderic Flamand, William Forsythe e Wayne McGregor é, no plano formal, uma oportunidade única para o cruzamento de linguagem artisticas, uma vez que envolve cerca de 17 europeus e 29 instituições para um conjunto de 24 jovens intérpretes vindos de vários pontos da Europa, que se divididem em dois grupos de trabalho/formação: Bruxelas e Marselha.

As condições singulares que coreografos como Preljocaj, através do Ballet Preljocaj/CCN – Aix-en-Provence ou Flamand no Ballet Nacional de Marselha, ao qual se junta a Raffinerie/Charleroi-Danse, em Bruxelas, de Michelle Anne de Mey e Thierry de Mey seriam razões mais do que suficientes para esperar da apresentação pública em Paris um acontecimento. Também porque a «contaminação» de algumas obras presentes pela dança e artes performativas (e vice-versa) justificariam uma abordagem atenta ao modo como o corpo se instala numa galeria de arte e, em particular, como é que estabelece diálogos críticos/criativos com as obras expostas.

A deslocação do corpo do intérprete do palco para a galeria de arte foi um dos gestos mais importantes do século XX, tendo dado origem a toda uma história «alternativa» para as artes performativas. Nomes como Allan Kaprow, Chris Burden, Bruce Nauman, Richard Serra ou Joseph Beuys deram ao acto performático e à consciência do corpo enquanto objecto de arte (ou devir-objecto de arte) uma dimensão tal que a simples utilização de uma galeria para uma performance se tornou um acto retórico.

Esta apresentação do projecto DANCE estava, por isso, a pisar terreno minado, também porque o próprio tema da exposição era complexo: se quisermos, a fixação dos corpos e dos objectos pelo cinema, bem como a manipulação dos códigos audivisuais para construir dramaturgias efémeras. A proposta consistia em desenvolver um outro olhar sobre as peças expostas nas 33 salas e corredores da exposição, a partir dos corpos dos oito intérpretes que se propuseram a participar. O que foi apresentado esteve bastante longe disso.

A abordagem, feita através de intervenções em salas pré-determinadas e de acesso reduzido ou entre projecções nos corredores, relevou uma leitura desatenta ao propósito quer da exposição (uma « narrativa » pela estrutura do cinema: defilement, projection, récit e montage), quer das obras (que acumulava projecções, instalações, pintura ou fotografia), quer da propria ideia do projecto DANCE, disfarçado que está nessa ideia (sempre nova, sempre superficial) da interdisciplinaridade artistica.

Os alunos, coreografados pelo coordenador da secção sul e responsavel pedagógico do Ballet Preljocaj, Emilio Catalano, apresentaram exercícios de estilo pouco motivantes e mesmo inconscientes. Dois exemplos, entre as mais de dez performances que executaram no espaço de hora e meia: na sala onde Claude Levêque apresentava Valstar Barbie, uma peça de 2003 onde o artista plástico desconstrói o arquétipo feminino a partir de uma imensa luz néon rosa e um sapato de salto alto gigante, ilustrado por uma valsa de Strauss distorcida, três raparigas e um rapaz procuravam dar a entender que algo de urgente lhes passava pelos corpos, tal era a violência dos movimentos. A ideia, que parecia assentar ela mesma numa desconstrução do movimento, perdia-se entre sequências ingénuas de sedução com o espectador, espasmos e orgasmos nervosos a passarem por urgências criativas e uma total ausência de relação com o espaço ou mesmo a presença dos outros intérpretes.

Insconsciente foi também a relação estabelecida entre o corpo de uma das intérpretes e dois dos filmes projectados no corredor principal: Le Ballet Mecanique (Fernand Léger, 1923-24) e Rythm (Len Lye, 1957). Ao som «produzido» pela montagem sincopada dos dois filmes, respondia deixando-se ficar em poses no banco, desatenta do anti-lirismo de Léger e Lye, no qual se construía um efeito de decomposição da forma a partir da (não)-relação corpo/máquina.

Outros exemplos envolviam a ocupação das salas, sendo corpo e objecto duas entidades que nunca se interligavam, ou quando o faziam, dada a estreiteza da sala, impediam o espectador de ver. Ou ainda o percorrer dos corredores como que a marcar o território, esquecendo mesmo que numa das paredes se projectava esse filme seminal de Bruce Nauman, Walking in an exaggerated manner around the perimeter of a square (1967-68), onde se confunde espaço e movimento numa alegoria hiper-perversa sobre o corpo e o tempo. Ou ainda a tentativa de fazerem humor negro (inevitavelmente, diria) com Giulietta (1993), a imensa escultura que Bertrand Lavier construíu com um carro quase destruído, e onde os intérpretes faziam de mortos, vítimas do acidente, ao mesmo temo que alguém tentava vender o carro.

Em resumo, a única razão porque não eramos indiferentes às intervenções era porque, precisamente, nos impediam o acesso às peças. Nesse aspecto até parece que respondiam ao «apelo» de Yann Beauvais que em Slibuyn (2004), projectava uma cidade no chão da galeria, sendo esta pisada e ignorada pelos visitantes. Mas nada do que ali foi apresentava parecia atento ao modo como se relaciona corpo, imagem, movimento, presença e dimensão semiótica. A intervenção do DANCE na exposição parecia fazer tábua rasa de qualquer teoria acerca das relações entre fixo e não-fixo, de Bergson a Deleuze, do proprio Forsythe ou Fréderic Flamand.

Talvez as «coreografias» pudessem reter alguma da sua relevância se apresentadas em estúdio e em mera fase de trabalho, já que eram pouco mais que pontos de partida. Em confronto com objectos artisticos tão fortes (o que não tem nada que ver com a defesa dos discursos das obras ou qualquer demagógico respeito pelo autor), para mais inseridos num contexto tão específico como o desta exposição, perderam toda a sua força. E as peças, essas, não ganharam nada. Pelo contrário. Para um projecto que se quer apresentar como alternativa ao ensino, já de si alternativo, é pouco. Ou melhor, é francamente lamentável. Mas, felizmente, efémero. Ao contrário do cinema.


Contextos:
Ler texto sobre o projecto DANCE publicado no site Ballet-Dance (inglês) e neste blog (português)

texto escrito com o apoio do Fundo Roberto Cimetta

1 comentário:

Anónimo disse...

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Extra: O Mar farta-se de "dançar" e os Portugueses desperdiçam toda essa Energia (energia das Ondas)!? Porque será? (para os Espanhóis nos impingirem energia eléctrica). Fim do Extra.
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Talvez a ENERGIA NUCLEAR, que é perigosa, - http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1254471 – NÃO VENHA A SER NECESSÁRIA em Portugal. Porquê?


--- CONCURSO: Divulgação das ENERGIAS RENOVÁVEIS.

Concurso Solar Padre Himalaya - Edição 2006. Em http://www.cienciaviva.pt/rede/energia/himalaya2006/home/

Ou em http://www.cienciaviva.pt/home/ / Concurso Solar Padre Himalaya / Uma iniciativa da SPES para a divulgação das energias renováveis, com o apoio da Ciência Viva.

Nota 1: Em 2005 inscreveram-se 70 Escolas. Em 2006 – e para quem não acredita em melhorias superiores a 100% - houve um aumento SUPERIOR A 150%. Inscreveram-se 187 Escolas.

Nota 2: Haverá um 25 de Abril em Portugal no ano em que se inscreverem 500 Escolas!


EXTRA DOCUMENTO:

--- CONCURSO EXTRA: "IDEIAS QUE MUDAM O MUNDO".

Para promover a cultura científica e tecnológica. Em http://jn.sapo.pt/2006/04/19/sociedade_e_vida/alunos_tentam_imaginar_a_vida_futuro.html


--- MELHORIA (grande) NACIONAL: Inovação, marcas e 'design' podem ser pesquisados 'online'. E isto graças a uma BASE DE DADOS (DataBase).
http://dn.sapo.pt/2006/04/20/economia/inovacao_marcas_e_design_podem_pesqu.html



--- PUBLICIDADE ENGANOSA (Será?!): Paguem um ORDENADO DE SEIS MIL E CEM (6100) EUROS, mensal, a cada um dos TRÊS DAS JUNTAS de Freguesia: O Presidente, o Tesoureiro e o Secretário.

Nota 1 – Sejam eles de que Partidos forem.

Nota 2 – Sejam eles Doutores, Engenheiros ou tenham a 4ª classe.

? Porquê? Porque as Juntas de Freguesia são o PRIMEIRO PILAR DA GOVERNAÇÃO de um País.

Em http://www.correiodominho.com/noticia.ler.php?SD=24&IDTema=7&ID=20776
ou caso falhe em http://eunaodesisto.blogs.sapo.pt/arquivo/2005_04.html#565183


Braga, 19.4.2006

mauricio_102@sapo.pt