terça-feira, maio 30, 2006

Livraria Especializada (VI): Pina Bausch, Falem-me de amor

Em Setembro passado, quando Pina Bausch apresentou no São Luiz - Teatro Municipal a coreografia Nelken, houve quem disesse que eram assombrosas as imagens contemporâneas da peça. Houve quem visse referências à guerra no Iraque, à ascensão dos extremismos de direita na Europa de leste e até à solidão provocada pela velocidade dos dias. Houve quem achasse que a peça tinha sido feita recentemente. Para muitos foi uma surpresa quando descobriram que datava de 1982. É este o método de Pina Bausch, diz Elisa Vaccarino no ensaio que abre o livro Falem-me de amor, editado em 2005 pela Fenda: " as ideias de Pina Bausch são de uma tal complexidade que nem o bailado clássico, nem o modern, nem o postmodern, são respostas à altura; nenhuma forma de corpo teatralizado poderia enfrentar essa urgência de polimorfismo, de polissemia, de enraizamento na solidez, na materialidade, no núcleo vivo da vida que todos conhecemos e de que nos apercebemos em muitos espectáculos de teatro contemporâneo" (p.17). Este livro, na verdade, não é exactamente de Pina Bausch, mas sobre Pina Bausch. São as actas de um colóquio realizado em 1992 em Turim, Itália, intitulado Pina Bausch: Teatro da Experiência, Dança da Vida, nome dado à edição italiana, lançada um ano depois. O título português reflecte bem as razões de ser desse colóquio onde se juntaram os "observadores atentos que a investigaram, amaram e observaram fielmente ao longo dos anos" (p. 12). O colóquio, justificado pela apresentação de Ifigénia na Táuride, peça de 1974 que a coreógrafa alemã perseguia pela necessidade de pensar o seu próprio repertório, "não visou uma exaustividade utópica, mas deu lugar a reflexões importantes sobre a sua figura, o seu talento tão vário e humano e a sua força criadora" (p. 12). Tratou-se da apresentação de abordagens (pessoais, diria) à obra de Pina Bausch a partir da obra entretanto realizada, dos contextos onde se inseriu, dos temas, matérias, processos, influências e legados. E do conceito tanztheater, no qual Bausch se especializou. Não é (nem quis ser) uma obra completa ou abrangente, porque é um testemunho dedicado e um contributo importante para pensar o lugar que a coreógrafa ocupa na dança actual. Até porque a própria parece querer deixar esse trabalho para os observadores. Pelo menos é isso que indica na breve entrevista que encerra o livro: "acabei por dizer para comigo que tinha que escolher entre seguir os meus planos ou, pelo contrário, deixar-me conduzir pelas coisas, pelas próprias coisas. Escolhi este último caminho e já não faço planos. É um caminho muito difícil, mais difícil do que o outro, porque se assumem riscos esperando que, num lapso de tempo muito limitado, algumas coisas aconteçam" (p. 176).

Edição: Fenda
Preço: 18€

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