Panorama de la danse contemporaine
de Rosita Boisseau
Mapa para a dança contemporânea
O que há de comum entre Ushio Amagatsu, Lucinda Childs, Alain Platel, Pina Bausch, Rachid Ouramdane, Meg Stuart, Josef Nadj, Sidi Larbi Cherkaoui, La Ribot ou Robyn Orlin, para além de serem coreógrafos cujo trabalho, salvaguardadas as distâncias e gostos pessoais, questiona permanentemente a dança e atravessa fronteiras artísticas, estéticas e nacionais? Para a francesa Rosita Boisseau, crítica do jornal Le Monde e da revista Télérama, são alguns dos noventa protagonistas da dança reunidos em Panorama de la danse contemporaine, um trabalho em curso, “sem conclusão”, não “um dicionário exaustivo mas a recolha de percursos escolhidos”.
Por isso o livro abre com uma apresentação genérica onde fala da influência de Maurice Béjart, Anna Halprin e Merce Cunningham na definição daquilo que se entende por dança contemporânea, traçando um percurso genérico sobre o modo como evoluiu a concepção de dança do final dos anos 70 até hoje. Os nomes são apresentados por ordem alfabética e acompanhados por extensa iconografia, muitas vezes do mesmo espectáculo, biografia seleccionada, breve perfil e questionário proustiano. Na selecção nota-se uma vontade de destacar a França e a sua realidade, “berço da dança contemporânea e o país onde os artistas são mais vigorosamente apoiados pelas instituições”, ficando claro tratar-se de uma obra dirigida ao público francês que busca “ainda e sempre os códigos de acesso a uma arte mais próxima do irracional que da lógica: não para enquadrar uma obra, mas para saborear os interstícios, lá onde a liberdade de cada um desliza e se descobre”. Razão pela qual não falta nenhum dos dezanove directores dos Centros Coreográficos Nacionais, tal como nomes que se têm destacado na/da cena francesa: Boris Charmatz, Allain Buffard ou Geisha Fontaine. Há ainda coreógrafos de Espanha, Bélgica, Alemanha, Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, Japão e Itália, bem como do Burkina-Faso e Israel, com os quais a realidade cultural francesa mantém relações.
Mas entre a escolha pessoal e “o impacto flagrante da marca coreográfica” de cada um dos escolhidos, se Boisseau opta por recusar movimentos ou escolas e evita convocar nomes como Matthew Bourne ou Marie Claude Pietragalla, criadores vedetas reconhecidos pelo grande público, também não arrisca na apresentação de outros que correm os circuitos de crítica e programação, alguma dela institucional, como Cláudia Triozzi, Xavier Le Roy, Jérôme Bel, Vera Mantero ou Lia Rodrigues. Opções certamente legítimas numa viagem acrítica e didáctica que Boisseau defende com “razões práticas e económicas” e, como sempre nestes casos, onde o que entra diz mais sobre o que fica de fora.
No que respeita ao seu conteúdo, são particularmente fascinantes algumas fotografias, as anotações de Bill T. Jones ou Anne Teresa de Keersmaeker, o croqui do espectáculo Régi, de Charmatz ou o esquema coreográfico de Susan Buirge. Mas a abordagem à la Proust impede conhecer, pela sua forma limitada, o fascinante processo de criação de alguns destes nomes. Boisseau quer saber “o espectáculo marcante”, “o lugar do íntimo”, “o sentido a dar ao trabalho” de cada um, um som ou uma cor ou parte do corpo que sirva de inspiração e, entre outras mais ou menos genéricas, o calcanhar de Aquiles de cada coreógrafo. Entre os que sintetizam as respostas e os que não responderam (sobretudo nomes fora de França), existem aqueles que se expõem, como Gilles Jobin que busca uma cena que o leve à prisão e os que consideram, como Daniel Larrieu, que o último tabu é “o fim da arte”. Sendo um trabalho meritório e louvável, não deixam de ecoar como metáfora desta incompletude as palavras de Caterine Sagna: “se encontrasse o último tabu, teria tema para a obra-prima que todos esperam, autores e espectadores” (Ed. Textuel, €59).
texto publicado na revista OBSCENA #1
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