terça-feira, outubro 14, 2003

Acerca das fábricas de ilusões

Um dos males mais evidentes do nosso tempo é com toda a certeza esta banalização do aparecer, do ser famoso, conhecido, talentoso, com o “bichinho” e por aí fora. Há uma espécie de síndroma “big brother”, “Caras”, “pimba”, que parece afectar as pessoas e, principalmente, a malta mais nova. As pessoas querem aparecer na televisão, querem ser conhecidas. Algumas decidem ir para modelos porque o que querem mesmo ser é actrizes. Alguém percebe a relação?
O facilitismo da mediatização, que torna qualquer idiota ilustre, é tão evidente que apetece desligar. Quem? Quem são essas pessoas? É o que faço, tentando desviar-me do excesso de tempo de antena que parecem ter. A selecção rigorosa é difícil, mas há que fazer um esforço.
Eu, confesso, tenho uma fraqueza. Mas também não tenho vergonha de admiti-la. Sou fã da Operação Triunfo. Adoro as galas, os resumos e até a Catarina Furtado me começa a chatear menos. O nível desta segunda edição é claramente superior e até custa a crer. Não querendo convencer-vos de nada, a verdade é que o conceito da OT é totalmente diferente de qualquer outro programa do género. É uma escola com bons professores, senão os melhores. É um facto que personifica alguma visão fascizóide, como se apenas os escolhidos pudessem lá entrar. No entanto, consegue formar, ao mesmo tempo que entretém. Por isso não incorre nesse erro gravíssimo de todos nós de achar que é fácil ou que não é preciso esforço. Gosto daqueles alunos, como gostava dos anteriores. Não são concorrentes, como na triste réplica da SIC, são alunos a tentarem evoluir, aprender e, também, ganhar.
Esta é a diferença fundamental.
Mas não pretendia que este post fosse (apenas) um elogio ao programa da RTP. Todas as áreas “artísticas” e sociais estão minadas por essa ideia de popularidade e pela banalidade da mediatização.
Até a literatura. Ontem, a esperar por uma amiga, estive uns dez, quinze minutos em frente a um cartaz do novo livro da Margarida Rebelo Pinto, a nossa escritora best-seller de serviço. O cartaz, para quem não viu, tem a figura da dita encostada ao seu livro em pose. O livro chama-se “I’m in love with a pop-star” e, aparentemente, conta a história de uma mulher que está apaixonada, adivinhem, pelo cantor Robbie Williams. Não conseguia deixar de olhar para o cartaz. Pensava. Por um lado, apesar de ser uma grande beta, ela tem atitude. Por outro, é insuportável a sua imagem. A imagem que transmite é o contrário daquela que idealizamos para qualquer escritor. Isso, no entanto, não seria importante se os livros dela fossem bons. Ela diz que é POP. Mas não é, antes fosse. Não precisa ter uma imagem pré-idealizada nem uma pseudo-intelectual. Bastava-lhe ser uma boa escritora. Acho que é sobre isso que estamos a falar, não?
Quem dera a mim que, em vez da austeridade, os bons escritores também cultivassem uma imagem mais leve, mais colorida, mais POP. Seria mais divertido.
O que é a imagem afinal? Qual o papel que ela tem? E como é que nos livramos da sujidade do excesso de vedetas? Não há nada a fazer. Impõe-se a tal selecção rigorosa e, principalmente, pessoal. Nós ficamos sossegaditos e eles que continuem a falar noutra casa, noutro ecrãn de TV, num rádio de outro carro.
Até breve!

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