sábado, março 19, 2005

Acho que vi o Jude Law*

Londres é o que quisermos que seja. Mas precisa que lhe respondamos com a mesma dose de energia, sob prejuízo de nos enfadarmos (esgotarmos?) com o excesso de informação. Cidade imensa, densa, intensa, Londres revolve-se e regurgita-se em doses maciças de conhecimento, deixando-nos num limbo emocional que não deve nem ao jet lag nem às diferenças de temperatura.

Em Londres está-se. Para se ser. E mais depressa nos atiramos para um canto esmagados pelo peso da cidade do que ganhamos fôlego para o que se segue. Não é lógica como Barcelona nem radial como Madrid ou compartimentada como Paris. Londres é uma cidade por inteiro que reclama por nós mesmo quando não conseguimos. E nessas alturas resta-nos seguir a corrente, seja ela a mole humana ou os imensos quilómetros do metropolitano.

Por mais que se ande a pé em Londres jamais se verá tudo. Até porque sentimos a necessidade de fechar os olhos, voltar a puxar das coordenadas e definir caminhos. Londres é, por isso, uma cidade de opções. E quanto mais autoritárias forem melhor. É a única forma de nos batermos contra uma cidade que vive por si. Independente de tudo.

Em Londres tudo é sempre pouco. Porque há muito mais. Uma espécie de hiper-tudo. E no meio de Picadilly Circus só apetece gritar: NÃO AGUENTO MAIS!! Porque de facto não se aguenta mais. E aí cumpre-se a máxima do diletantismo: adormecer numa cidade estrangeira, sabendo que podíamos ir ver alguma coisa. Londres obriga-nos a optar entre o bilhete postal e a apreensão para memória futura. Ou seja, acredito que de nada serve ir "picar o ponto" aos sítios se neles só conseguirmos estar porque sim. Lá vai-se porque se quer isso. Caso contrário não nos serve de nada. É mais um risco na lista de coisas a ver. E antes ficar por conhecer que sentir que não se viu de facto.

Portanto, em Londres se queres olhar, vê, se queres ver, observa.

Pela altura em que saímos da cidade, já aprendemos a olhar para o lado certo das passadeiras, a perceber o tempo dos semáforos, a não reagir ao cruzar de faixas pelos autocarros que quase parecem ir esmagar os automóveis... Já identificamos as moedas e as notas mesmo que achemos que nos falta o dinheiro todo. E converter libras para escudos e depois para euros não é a melhor opção. Porque se nos deixarmos dominar pelo "pânico" do orçamento, acabamos por poupar desnecessariamente.

A cidade já não é só a das senhoras com cara de compota, do chá das cinco ou gabardines e chapéus de chuva. Já não se vêem homens de chapéu de côco, nem terriers com padrões axadrezados nem relógios de bolso ou bigodes cofiadas a cera. Ainda existem os autocarros de dois andares que nos fazem engolir em seco quando nos sentamos na fila da frente do 2º andar. Parece sempre que vamos cair. E há os musicais, verdadeira força motriz de uma cidade que vive o turismo e o consumo de cultura (primária, secundária, terciária) de forma quase pornográfica.

Das caixas de chá preto do Harrods aos sabonetes de lavanda da loja de presentes da Galeria da Rainha, Londres pode ser tão kitsch quanto quisermos. E o seu contrário. Há de tudo para todos os gostos. Como nas farmácias. Que não existem e se chamam Boots e vendem de tudo.

E depois há o pulsar sexual. Londres cheira a sexo, erotismo, tensão, erecção, desejo, carne e morte. Não só pela chuva que insiste em cair e libertar as feromonas, mas porque é tudo exposto. Para quem quiser. Ninguém tem nada a ver com isso e portanto não há restrições. É uma cidade livre e liberta, mesmo que saibamos que nada é assim tão simples.

Londres é uma falta de ar e o balão de oxigénio. E, por isso, a Londres deve regressar-se sempre. Mas em doses moderadas. Porque imprópria para cardíacos, urbano-depressivos, descrentes, cépticos, workaholics, desiludidos e solitários. Não só porque acentua tudo isso como nos faz correr o risco de começar mal uma relação que se quer prolongada.

* em todos os rapazes de Londres. Giros, sensuais, eróticos e so so fuckable... É tudo muito, de facto.

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