sexta-feira, janeiro 28, 2005

Oficialmente

Se o governo não tivesse sido demitido, razões não faltavam para o ser todos os dias. A ler, hoje no PÚBLICO (link não disponível) o comentário da editora Bárbara Reis ao desmazelo da Ministra da Cultura, Maria João Bustorff, acerca do fim das investigações sobre o roubo das jóias da coroa em Haia.

Um e-mail também é informação oficial

por Bárbara Reis

Maria João Bustorff, ministra da Cultura e provável deputada pelo PSD do futuro parlamento, emitiu um comunicado na quarta-feira, em resposta à notícia do PÚBLICO da suspensão das investigações do roubo das jóias da coroa portuguesa, para dizer que "o Ministério da Cultura não foi informado oficialmente". O escudo do "oficial" serviu apenas ao Ministério da Cultura para não dizer nada sobre o que era uma notícia importante: os holandeses deram a investigação como fechada, ou seja, deram as jóias como perdidas, não há pistas a seguir.

Mas o que é uma "informação oficial"? Um documento lacrado enviado por um mensageiro num cavalo branco? Há anos que a informação institucional se tornou mais informal e fluida. "Uma comunicação oficial até pode ser um e-mail", disse ontem, sem hesitar, o diplomata Botelho de Sousa, director do gabinete de Informação e Imprensa do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Portugal não vai recuperar o castão e bengala de D. José I com 387 brilhantes nem o diamante de 135 quilates com nada do que a ministra Burtorff possa dizer. Mas não faria mais sentido dizer aos portugueses - a quem as jóias, afinal, pertencem - qualquer outra coisa, nem que fosse que o Estado lamenta que as investigações não tenham tido sucesso e que, nestes dois anos, o Ministério repensou apolitica de empréstimo das jóias da coroa e aprendeu lições? Nada disto, claro, é surpreendente, é estratégia dos três "c" - ficamos "calados" porque os jornalistas são uns "chatos" que só levantam questões "cretinas" - é regra nas instituições portuguesas. Se o roubo tivesse sido na China, o contraste não era tão óbvio. Mas foi em Haia e quando se passeia nas cidades holandesas, vê-se sempre o que se passa dentro das casas - e em Portugal a regra são as cortinas fechadas.

A 3 de Dezembro de 2002 - dia a seguir ao roubo - as duas conferências de imprensa dadas em Lisboa e em Haia sobre o roubo não podiam ter sido mais diferentes. Na de Lisboa, estavam o então ministro da Cultura Pedro Roseta, a directora do Palácio Nacional da Ajuda (há mais de 20 anos) Isabel Silveira Godinho e o então presidente do Ippar, Luís Calado, e nada de concreto foi dito porque, justificaram, seguiam instruções da Interpol. Em Haia, porém, Bert Molsbergen, director do museu onde o roubo se deu, informou a imprensa, entre outras coisas, que as jóias portuguesas eram - de todas as roubadas - as mais valiosas, e revelou o valor do seguro português: 6,5 milhões de euros.

Dois anos depois, com nova ministra na Cultura, nada mudou. A Holanda anunciou o fim da investigação e disse que informou o Estado português há dois meses, e Bustoríf não comentou a notícia quando o PÚBLICO ligou (desde as 9h30 até às 20h30). E, três dias depois, insiste que não tem nada para dizer. Porque não sabe "oficialmente".


Notícia no PÚBLICO que contextualiza o comentário de Bárbara Reis.

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